quinta-feira, 28 de dezembro de 2017


https://desafio-te.pt/t-892/

E depois de ter vivido quatro décadas, mais um ano e uns meses, posso afirmar que gosto de mim e gosto do que vejo ao espelho. Penso que é bastante comum a mulher mais jovem encontrar 1001 defeitos em si. Num momento em que tem uma pele perfeita, sem rugas e sem manchas, um corpo que apresenta poucos traços de celulite ou da idade, a mulher é capaz (e eu era capaz) de encontrar um sem número de imperfeições em si. Contudo, à medida que entramos na terceira década vamos perdendo, ou, pelo menos, eu fui perdendo esses “mimimis” de mulher mais nova e tornando-me, gradualmente, mais mulher. Quando cheguei aos 40 assumi-me como a mulher que sou, com as qualidades e defeitos que aceito sem complexos.
Já não tenho a pele de outrora…é um facto. Tenho manchas nela que não aceitei logo quando se instalaram. Contudo, percebi que fui adquirindo uma serenidade no rosto que suaviza aquelas que são as marcas do tempo. O olhar, esse, não envelheceu. Mantem-se vivo, com uma certa travessura e uma luz de desafio para com a vida. A voz foi ficando gradualmente mais rouca. Pareço um velho carroceiro mas quero acreditar que isso me acrescenta sensualidade! Aceitei, finalmente, que sou, como diz o meu pai, uma “pequena natureza” (um metro e meio de gente!). E por ter aceitado a minha altura sinto-me tão bonita e feminina num salto alto, como num ténis ou num chinelo. Sinto-me bem na minha pele porque faço exercício físico para assim lutar contra o passar do tempo que nos vai fazendo perceber o peso da gravidade…e sinto-me bem na minha pele porque exercito a minha mente: leio, escrevo, vou ao cinema, procuro maravilhar-me com a eterna novidade de tudo o que me rodeia.
Os defeitos que habitam em mim desde que sou gente continuam por cá como velhos companheiros. Continuo com péssimo acordar, continuo a parecer um camionista irado quando estou na estrada a conduzir, continuo a ser briguenta sempre que me surge pela frente uma causa pela qual me parece valer a pena brigar. Mas sei que essas brigas são feitas de forma mais contida. Percebi que não é necessariamente aquele que fala mais alto, aquele que terá mais razão. Aprendi a tirar o melhor partido de tudo o que me rodeia e aprendi que em todas as situações menos boas encontramos, ainda assim, algo de bom. Aprendi que o mundo não é perfeito mas que há muita coisa perfeita (uma paisagem alentejana, um dia de neve na Serra da Estrela, um por-de-sol na praia, o sorrido daqueles que amamos, são apenas alguns exemplos).
Aprendi, ao observar o mundo imperfeito, que eu não sou perfeita mas que possuo alguma perfeição: aproveito a vida a mãos cheias, procuro vivê-la a 100%, procuro ser feliz. E sei, porque também aprendi, que a felicidade é o que nos torna um pouco mais perfeitos, mais bonitos e atraentes.
Por tudo isto digo: gosto do mundo, da vida e gosto de mim! 

terça-feira, 26 de dezembro de 2017



http://p3.publico.pt/cultura/mp3/25231/musicas-de-natal-sonho-ou-pesadelo

E eis que o Natal está terminado. A correria para comprar bacalhau e peru está terminada, a correria para adquirir tudo o que é necessário para realizar a melhor e mais conseguida ceia de Natal está encerrada, as prendas já foram oferecidas e abertas, já se percebeu se acertámos ou não no presente. Poderíamos pensar então que terminou a época natalícia. Mas desenganem-se! Durante a semana que medeia entre o Natal e as festas de fim de ano, reiniciam-se as correrias aos centros comerciais e às lojas. Ainda vamos comprar um presente para aquela pessoa de quem não nos lembrámos mas que se lembrou de nós oferecendo-nos uma prenda, ainda vamos trocar aquele pijama que a tia ofereceu, tendo-se enganado totalmente no tamanho, e começamos a efetuar as compras já a pensar nas festividades de final de ano. Numa só frase: a época natalícia com todo o seu bulício e correria mantém-se. E, como não poderia deixar de ser, a banda sonora para a correria também se mantém. E que banda sonora é essa: as músicas de Natal.
Não me consigo decidir se o All I want for Christmas is you, Have yourself a merry Christmas, Last Christmas, Feliz Navidad, It’s beginning to look a lot like Christmas, ou a nossa portuguesa Nessa noite branca são uma doce recordação que nos chega ano após ano ou, pelo contrário, se são um pesadelo. A verdade é que quando a época se inicia até sabe bem reencontrar esses velhos companheiros de estrada que nos levam a cantarolar, mais que não seja, os refrãos. Conhecemos aquelas músicas naquilo que nos parece ser um “desde sempre”. Sentimos alguma nostalgia, afloram as recordações de natais passados que também aconteceram ao som daquelas eternas músicas natalícias. Sentimos que este ano em especial o nosso espírito natalício vai brotar a 100%. Vamos adorar as decorações, as músicas, as correrias. Vamos preparar uma excelente ceia de Natal! Vamos estar imbuídos dos maiores e melhores sentimentos. Vamos fazer o bem e acreditar num mundo melhor!
Contudo, com o passar do tempo, ouvir estas músicas constantemente torna-se algo próximo de um pesadelo. Exemplificando: Alguns dias antes do Natal, procurando a prenda certa para as pessoas que tornam a minha vida mais doce, entrei, como é normal, em várias lojas. E não minto se disser que em quatro lojas diferentes ouvi quatro versões diferentes do “Last Christmas” dos Wham! Assumo que até é uma daquelas que no início da época me fazem subir o volume do rádio e cantarolar mas a dose é demasiado elevada durante esta época para se tornar suportável! O mesmo acontece com as outras músicas de Natal: ouvem-se em todo o lado! E sentes que, aos poucos, vais ficando com uma certa irritação latente sem saberes explicar bem porquê.
Anexadas a estas músicas de Natal chegam sempre umas outras que, não sendo de Natal, poderiam ser. E também estas são ouvidas, ano após ano, especialmente nesta época. A encabeçar a lista uma música que, assumo, será a única que consigo ouvir desde sempre, sem me cansar: We are the world. Tendo em conta que a música foi gravada com o intuito de arrecadar fundos para combater a fome no continente africano, faz-me algum sentido que a mesma seja recordada numa época que se quer de sentimentos positivos. Outra música que não sendo de Natal é sempre muito recordada (talvez pelo próprio título) será a do malogrado George Michael, Jesus to a child, entre outras que, ano após ano, recuperam vida durante esse período.
A verdade é que a lista de canções de Natal é interminável mas as rádios e, sobretudo, as grandes superfícies comerciais, insistem em criar em nós uma tradição: ouvir, quase em loop, sempre as mesmas canções, ano após ano, sem grandes alterações na lista. Todos os anos algum cantor ou grupo tenta criar um novo hit natalício: Christmas lights dos Coldplay é, quanto a mim, uma das músicas de Natal mais perfeitas que foram lançadas. Curiosamente, é pouco ouvida nas rádios. A própria Sia lançou este ano um álbum recheado com dez canções de Natal: Everyday is Christmas. Contudo, também esse pouco foi ouvido nas rádios e não me lembro de ouvir nenhum dos temas numa superfície comercial ou pelas ruas das cidades que percorri. Desconfio que existe uma playlist de músicas de Natal que não aceita grandes novidades nem grandes alterações. É imperioso que a lista em questão seja ouvida entre 1000 e 1500 vezes durante o mês de dezembro sob pena do mundo acabar se tal não acontecer!
Assumo: ainda o Natal não é chegado e já eu me sinto meio stressada com a repetição constante destas músicas. Onde quer que se vá: lojas, cafés, ruas, as benditas são omnipresentes. E aquilo que começa por ser pouco mais que um som de fundo chega, ao fim de muito pouco tempo, a um barulho praticamente ensurdecedor que enlouquece qualquer um. E sim, sinto que é atingido, com essa repetição ad nauseam das mesmas músicas, o efeito contrário: em vez de ajudar à construção do espírito natalício, sinto que começa a germinar, em todos os massacrados, uma vontade incontrolável que a época termine e que tudo volte ao normal, com ruas, lojas, centros comerciais sem música ambiente natalícia e com as rádios a passar o tipo de música que lhes é habitual. O muito passou a demasiado e torna-se, por isso, insuportável!  

A época natalícia está quase terminada. Mais uma semana de músicas de Natal e o mundo voltará a entrar na normalidade…já me sinto a respirar com maior facilidade!

segunda-feira, 18 de dezembro de 2017


http://pet.publico.pt/2017/12/18/circos-sem-animais-sim/

Estamos em época natalícia. E Natal é a época em que a alegria e os sentimentos bons devem reinar (Pelo menos, é isso que nos vão dizendo desde os nossos mais tenros anos). E, assumo que não sendo uma “incondicional” do Natal, procuro pôr em prática esses sentimentos bons ao longo da época. Assim sendo, nesta época tento ser mais solidária, praticar alguma boa ação e procuro de facto encontrar motivos para estar mais alegre e feliz, acreditando que todos nós podemos ser mais humanos.
E este ano não foi difícil procurar uma situação que me deixasse mais feliz uma vez que os meus olhos se cruzaram com a informação que muito me agradou: o PAN agendou para ser debatido na Assembleia da República, no dia 21 deste mês, um projeto-lei que prevê a proibição total da presença de animais no circo. E sim, sou daquelas pessoas que aplaude de pé este debate e que espera que ele venha a trazer o único resultado possível: a proibição de utilizar qualquer animal no circo. E aplaudo de pé a data em que tal projeto irá passar. Natal é muitas vezes ligado à ideia de circo. Tempo livre, férias, parece ser sempre um bom programa levar as crianças ao circo. Que fique claro que nada tenho contra o circo (apesar de não apreciar muito palhaços que me oferecem mais pesadelos que gargalhadas). Tenho sim uma indignação e até alguma raiva, contra os circos que continuam a usar animais para gáudio dos seres humanos – pequenos e graúdos – que vão apreciar um leão ou tigre a saltar por aros de fogo, cavalos que executam uma espécie de dança sobre duas patas e uma infinidade de atuações grotescas de outros tantos animais. Do que pude ler e perceber, verifiquei que ainda é permitido atuarem, como vedetas do circo, animais como tigres, leões, hipopótamos, camelos, tubarões, zebras, serpentes, cães, cavalos, póneis, burros e raposas. Não sei se os números continuam a ser aqueles que via em criança – quando a própria escola me levava a ver esse infeliz espetáculo – mas sei e tenho certeza que a violência física e psicológica a que são submetidos esses animais se mantém.
 É de esperar, como aconteceu em 2009, quando foi proibida a aquisição e reprodução de certos animais, tais como primatas, ursos, morsas, focas, entre outros, que se ergam as vozes da revolta. Aliás, também já me fui cruzando com algumas. A que mais me chamou a atenção, por ser quase infantil na defesa que faz é a de Dantas Rodrigues. Ora este senhor vaticina a morte do circo, referindo logo no título do seu artigo que “Lá se vai o circo” (Como se a arte circense a apoiasse apenas e só na apresentação de uns quantos números de animais obrigados a realizar malabarismos medonhos). Perturba-o que terminem com as suas memórias de infância do circo com animais. Pelos vistos também aprecia observar aves cativas só porque, quando era um “jovem crianço” colecionava cromos. Argumentos de “sempre foi assim” e de “esta é a tradição” (tal como se defende nas touradas). Não existe argumento mais pobre que esse. Há que reconhecer que se ouvíssemos sempre a tradição provavelmente ainda estaríamos em tempos de escravatura e provavelmente seríamos completamente a favor da pena de morte. Como dizia Einstein “a tradição é a personalidade dos imbecis”.
Afirmo: Circos com animais são inadmissíveis. O sofrimento que lhes é provocado, tanto física como psicologicamente, não pode ser entendido como um mal necessário à manutenção da tradição. Sim, ouço dizer que são bem tratados quando não estão nos espetáculos. Que são bem alimentados, que vivem bem…em habitats, na maior parte das vezes, completamente diferentes do seu. Mas são bem tratados… Obrigar esses animais a viagens constantes, em jaulas exíguas, é tratá-los bem. Deve ser pouco stressante para eles “passear” por esses caminhos portugueses. Forçar os animais a executar movimentos, a agir de determinada maneira (andar em duas patas, saltar por aros de fogo, executar supostas danças – como se via nos elefantes) não poderá ser visto como algo de bom nem como algo belo, se de estética quisermos falar. Esses comportamentos nada têm a ver com a vivência de animais da mesma espécie quando se encontram em liberdade. São movimentos que com frequência são desconfortáveis, assim como perigosos (um elefante apoiar todo o seu peso em duas patas não poderá ser algo inócuo para ele…). Para além de todas as questões físicas, há que pensar nas dores psicológicas – todo o ambiente da apresentação num circo, as luzes, o barulho, a presença de muitas pessoas, só poderão ser angustiantes, difíceis de suportar e stressantes. Mas diz-se: “os animais são bem tratados nos circos portugueses”… E, por fim, pensemos como conseguem os “treinadores” controlar o comportamento dos animais, obrigá-los a realizar esses truques todos que oferecem ao público? Sabe-se que é frequente o uso de chicotes, de focinheiras…já ouvi falar em bastões elétricos… A verdade é que para obrigar um animal a executar aqueles movimentos grotescos há que quebrar a sua força de vontade, há que dar a perceber quem é o mestre e quem é a besta…tudo isso será, mais uma vez, tratar bem um animal?
A proposta do PAN é que sejam proibidos todos os animais no circo e que os mesmos sejam reencaminhados para reservas onde possam recuperar e preservar a sua integridade. Mais uma vez reafirmo que concordo, também, com essa solução.
O vaticínio do senhor Dantas de que o circo ficará mais pobre sem animais, que está anunciada a sua morte, mais não é do que a incapacidade de perceber o que já ficou provado pelo Cirque du Soleil e alguns outros que abandonaram a presença dos animais no espetáculo: a arte humana é suficiente para manter de boa saúde o maior espetáculo do mundo!
Por fim, e porque as palavras já vão sendo excessivas, uma pequena nota: não basta legislar sobre a presença de animais no circo. Há que relembrar a existência das touradas, dos espetáculos de golfinhos e leões-marinhos ou de todo e qualquer espetáculo público de exibição de animais para diversão do ser humano. Todos eles deveriam ser, também, questionados…


sexta-feira, 15 de dezembro de 2017


A minha primeira incursão no género "Contos". Enjoy

“Duas vidas, um comboio, um livro, o amor”
Todos os dias de Maria se iniciavam da mesma forma, seguindo a mesma rotina: Maria levantava-se de madrugada, tomava o seu duche, tomava o pequeno-almoço, acariciava o seu gato e saia de casa num passo apressado. Todos os dias Maria chegava à estação de comboios e aguardava por aquele comboio que a levaria a caminho do seu emprego. Quando chegava o seu comboio, escolhia uma carruagem o mais livre possível, sentava-se e tentava ligar-se ao mundo. Desengane-se o leitor que pensa que esta tentativa de se ligar ao mundo era feita através do diálogo com os outros passageiros. Também não era feita pela leitura de algum jornal matutino. Quando muito, Maria lia os títulos maiores no jornal online, utilizando para tal o tablet ou o smartphone (abençoados equipamentos que permitiam que, quando a um faltasse a bateria, existisse o outro).
Os tempos “perdidos” nos transportes públicos, que eram bem longos, eram ocupados no manuseamento desses equipamentos. De fones nos ouvidos, de olhar vazio, ouvia, através do seu smartphone, um programa de rádio, um podcast, ou apenas música. Por vezes ouvia isto enquanto percorria as redes sociais…Facebook, Instagram … elas eram a sua forma de socializar, eram a sua forma de perceber o mundo diariamente: atenta ao que se passava a muitos quilómetros dali, pelo mundo inteiro, mas completamente ausente de tudo o que se passava ao lado dela. De facto, ela não se apercebia da idosa cansada que todos os dias entrava naquele comboio, à mesma hora, sem nada de concreto para fazer durante e após a viagem. Apenas realizava aquela viagem, diariamente, para encetar conversa com os passageiros, numa luta pessoal contra uma solidão crescente. Maria não se apercebia da mãe solteira que todos os dias levava a filha pela mão a caminho da escola, antes de seguir para o trabalho. Não iria perceber que apesar do cansaço aquela mãe conversava e ouvia atentamente as histórias da filha sobre o seu sonho com monstros. Não se apercebia dos quatro ou cinco adolescentes que socializavam através dos seus telefones, não trocando uma palavra entre eles. Não se apercebia do jovem estudante de Erasmus que observava atentamente todos os dias a cidade a desdobrar-se perante os seus olhos com a curiosidade de alguém que não pertence a este local e por isso se maravilha com qualquer alteração na luz e nos cheiros. E muito menos se apercebia de António, que todos os dias fazia questão de ocupar a mesma carruagem que ela. Todos os dias António, acompanhado de um qualquer livro que se encontrava a ler naquele momento, tentava ler (ou tentava dar a ilusão que lia) enquanto, discretamente, procurava observar aquele rosto que o intrigava, tentava capar aquele olhar que se perdia apenas na contemplação de um vazio ou na observação do ecrã do seu smartphone.
Foi tentando chamar a atenção dela com o tipo de livros que trazia em mãos. Sabia, melhor que ninguém, que os livros não se avaliam pela capa contudo, tentava captar-lhe a atenção com vários livros, através dos seus títulos. Tentou mostrar-se interessado por livros que falavam de animais (afinal os animais e as suas aventuras são sempre um tema de interesse para as mulheres, pensava ele). Como tal, optou por um título vencedor: “Marley e Eu”. Todavia, não vislumbrou qualquer tipo de interesse no olhar dela. Procurou chocá-la com um título bastante sugestivo: “Homens que odeiam mulheres”. Por mais de uma semana o carregou mas ficou-lhe a certeza de que ela nunca terá olhado para o livro ou para a sua capa. Procurou espicaçá-la com livros ditos de autoajuda com títulos tão sugestivos como “Porque os homens fazem sexo e as mulheres fazem amor?” Procurou mostrar-se um homem romântico, lendo autores conhecidos por serem mais apreciados pelo público feminino. Ofereceu grande destaque àquele que as suas amigas diziam ser o mestre: Nicholas Sparks. Com nenhum deles conseguiu captar a atenção de Maria.
Os dias sucediam-se lentamente, as estações iam passando, a paisagem ia-se alterando, ao ritmo das leituras de António. A primavera tinha dado lugar ao verão, ao interregno das férias, ao regresso das rotinas com os mesmos rostos a viajar no comboio. Chegou o outono e pouco depois dessa chegada, começou a anunciar-se o Natal. É verdade que as temperaturas ainda não indicavam grandes e rigorosos invernos mas os dias já eram mais pequenos e as manhãs mais frias. As ruas e as lojas começavam a ver-se enfeitadas de espírito natalício. António continuava a viajar no mesmo comboio, assim como Maria. Contudo, quanto mais António tinha noção da presença de Maria, mais alheada parecia Maria de tudo o que a rodeava. A sua atenção, como sempre e desde sempre, estava presa àquelas vidas que acompanhava pelas redes sociais.
E chegou o dia em que António decidiu dar vida a um derradeiro esforço. A sua última tentativa contou com a ajuda de um livro que já considerava ser um clássico, um dos seus livros de cabeceira: “Cem Anos de Solidão”. Desta feita optou por, depois de ler enquanto observava, como sempre, a sua colega de viagem, casualmente esquecer os “Cem Anos de Solidão” em cima do banco… Abandonou ali uma das obras que ele mais apreciava, jogando a sua última cartada. Ela pegou nele, correu atrás de António mas ele já não a ouviu. Era o tudo ou nada para António. Se esta última tentativa não trouxesse os frutos aguardados esqueceria esta ideia fixa de conhecer Maria.
Maria voltou então para o caminho que levava…com o livro em mãos…que mais poderia fazer? À hora de almoço, e pela primeira vez em muitos anos, decidiu folhear o livro em vez de passar o dedo pelo ecrã do smartphone. Tratava-se do famoso “Cem anos...” do não menos famoso Gabriel Garcia Márquez. Até ela, que pouco lia, conhecia a obra e o autor. Pelo meio encontrou um pequeno bilhete que dizia de forma sucinta:

“Estamos na época de Natal. Decidi oferecer um livro…encontraste-o, considera-o teu. Espero que ele consiga ocupar o teu tempo, fazer-te companhia e combater a solidão que por vezes nos assola. Assinado: António”.

No dia seguinte, tal como todos os outros dias, Maria levantou-se de madrugada, tomou o seu duche, tomou o pequeno-almoço, acariciou o seu gato e saiu de casa num passo apressado. Na mão levava o romance: “Cem anos de solidão”. Tal como todos os outros dias, caminhou apressada em direção à estação de comboios. E tal como os outros dias aguardou que o comboio chegasse, para entrar em seguida na carruagem. Mas hoje, e não como os outros dias, ela não sentou e baixou a cabeça em direção ao telefone. Sentou-se, com o seu livro em mãos e ofereceu-se o tempo de observar tudo quanto a rodeava. Viu a mulher idosa que todos os dias conversava com uma pessoa diferente. Viu a mãe da criança que já tinha um olhar cansado logo pela manhã mas que ouvia com interesse a sua filha. Viu os jovens que socializavam através dos seus telefones, não trocando uma palavra entre eles. Viu o jovem estudante de Erasmus que continuava maravilhado com a cidade e com as suas gentes. E, finalmente, viu-o. Pela primeira vez os olhares cruzaram-se, as bocas entreabriram-se num sorriso. O olhar de António desceu para as mãos de Maria, que seguravam, como se de um tesouro se tratasse, os “Cem anos de Solidão” e um novo sorriso nasceu no seu rosto. “Olá, sou o António” – foram essas as palavras dele…

Anos mais tarde, numa biblioteca caseira, este seria o livro que ainda ocuparia o lugar central na casa de António e Maria. Aquele era o símbolo da sua união.

quinta-feira, 14 de dezembro de 2017


http://p3.publico.pt/actualidade/sociedade/25134/lareira-e-os-pequenos-grandes-prazeres-que-ela-nos-traz#.WjJfD0V6SpE.facebook

A lareira…e os pequenos grandes prazeres que ela nos traz!
Existem prazeres que considero estarem intimamente relacionados à província. O prazer de estar sentado a uma lareira é um deles.
Nasci em França. Vivi os primeiros anos da minha infância numa zona do país bastante fria, que não raras vezes nos brindava com neve. O frio, na rua, era cortante. É uma das recordações que tenho. Mas, em casa, o ambiente era para lá de quente. Aquecimento central em todas as divisões, temperaturas a fazer lembrar mais facilmente o verão que o inverno que se passeava lá fora. Contudo, não possuía lareira. Apenas uns radiadores de parede, alimentados, na época, a gasóleo, que traziam uma sensação de enorme calor mas que não ofereciam aquela sensação de aconchego que uma lareira nos pode trazer.
“Conheci” as lareiras e as suas qualidades, mais tarde, quando passei a viver em Portugal. Não só a nossa casa tinha lareiras como as casas dos meus avós também as tinham. É claro que já as tinha visto antes. Mas apenas as via no verão, sem lume, um local arrumado a um canto ocupado por umas quantas panelas de ferro fora de uso naquela época. Lembro a estranheza que se apoderou de mim a primeira vez que senti frio em Portugal. Eu conhecia o Portugal das férias, o do mês de agosto, aquele em que está sempre sol, não chove e não faz frio. A ideia de frio, da necessidade de acender uma lareira, não se coadunava com essa imagem que tinha criado ao longo dos meus primeiros anos de vida. Assumo que os primeiros anos em Portugal foram de invernos difíceis. Claramente a temperatura dentro das casas não era aquela a que estava habituada em França. Nem a nossa casa, nem as casas dos meus avós estavam apetrechadas com aquecimento central. Penso que não era ainda muito usual, no país de início dos anos 80, o aquecimento central. Possuíamos uns radiadores nos quartos e o centro da casa, o local onde todos nos reuníamos, era a lareira – estivesse ela na cozinha, ou na sala de estar, o certo é que era lá que nos reuníamos para aquecer o corpo e, descobri mais tarde, aquecer a alma.
Descobri o prazer de estar sentada a uma lareira, a observar serenamente o tempo passar, com as minhas avós. No inverno, muito do dia era passado à lareira. O lume (como se diz por cá) era aceso logo de manhã. As minhas avós ainda cultivaram o cozinhar em panelas de ferro, lentamente, usando o lume. Por isso ele era presença constante, da manhã à noite. Mas era as tardes que me agradavam. Chegar da escola e tomar o lanche à lareira era um prazer que descobri nessa época. O chá (imprescindível na hora do lanche) sabia melhor quando sentada, nas pequenas cadeiras de palha, feitas de propósito naquele pequeno tamanho para nos podermos aproximar do lume e nos aquecermos convenientemente. A acompanhar o chá vinham as torradas de lume (que ainda hoje considero daquelas coisas simples mas que são maravilhosas!) Lanche terminado, ali ficávamos a ver o dia findar, a luz dar lugar à noite e à lua, enquanto contávamos o nosso dia, as peripécias que poderiam ter acontecido ou se desfiavam memórias (as minhas avós) de tempos da juventude. E, por vezes, apenas ficávamos em silêncio, a observar as chamas, a ouvir o crepitar da lenha a arder. E foi nesses silêncios que percebi que a lareira e o lume fazem companhia. Não te sentes só quando tens o lume a arder. Ele é uma companhia quer estejas acompanhada ou sozinha. Quem nunca leu um livro junto à lareira? Quem nunca se deixou embalar pelo calor que dela emana e dormitou, apreciando o seu calor? Quem nunca bebericou um vinho ou uma jeropiga (tão nossa!) observando o dançar das chamas? Quem nunca viu um filme de “sábado à tarde” (Aqueles filmes que pouco te interessam mas que vês, em estado semivegetativo) apenas porque se sentia quentinho à lareira, apesar do frio imenso lá fora? E ainda, quem nunca ao observar um bom lume numa lareira, deu por si, de algum modo, a meditar, a limpar a mente, a pensar sobre a vida e, sobretudo, a procurar alguma serenidade?
Por outro lado, a lareira e o lume são os grandes companheiros para quando estás em companhia. Haverá algo melhor que os petiscos com amigos à volta de uma lareira? As conversas fiadas, as horas perdidas, enquanto se assa e saboreia uma morcela ou uma chouriça, são um programa ótimo para as tardes e noites de inverno. E se a companhia for a nossa cara-metade? Também a lareira será um poderoso aliado, desta feita, na criação de um ambiente propício ao romantismo (todos nós teremos a cabeça povoada de imagens de chalés na montanha e uma lareira, penso eu!)
Sou capaz de ficar horas sentada à lareira: a pensar na vida, observando a dança das chamas a aumentar ou a diminuir, a mudar as suas tonalidades, a apreciar o seu calor e a sua companhia, a petiscar (quem nunca comeu laranjas à lareira perdeu um pouco de céu!), a deixar-me envolver pelo seu calor bom, aconchegante. E isto porque gosto de um bom lume, de um lume que me aqueça o corpo e a alma. O lume faz-me sentir, nem sei bem porquê, em companhia e em segurança. Faz-me sentir bem. Penso que não serei a única…





sexta-feira, 1 de dezembro de 2017


Da morte… e da dor
E de tempos a tempos, a vida faz questão de nos lembrar, da forma mais brutal, que ela é vida e que por isso se nasce, cresce e morre. A verdade mais elementar é que todos os dias nascem pessoas. E, da mesma forma, todos os dias morrem pessoas. Por isso, viver é saber conviver com a imensa alegria que nos traz um nascimento, assim como, com a enorme tristeza que o desaparecimento de uma pessoa nos provoca.
Contudo, verificamos cada vez mais que somos uma sociedade que não se encontra preparada para a morte, nem para a perda daqueles que nos são caros, daqueles que, de um modo ou de outro, fazem parte da nossa vida. O facto de sabermos que esta é a lei da vida, que a morte é parte integrante da nossa existência, não nos prepara para a partida de qualquer ente querido. Somos uma sociedade que sonha com a juventude eterna. Usamos todo o tipo de cremes, todo o tipo de tratamentos para adiar uma velhice que nos aproximará (se a caminhada ocorrer de um modo dito normal) da ideia de morte. Não pensamos na possibilidade constante da morte (nossa e dos nossos) e, de um modo pueril, achamos que ela acontece aos outros, a outras pessoas e a outras famílias. E esse pensamento é necessário para vivermos com alguma serenidade, arrumando numa parte escura do nosso cérebro a possibilidade constante de desaparecer deste mundo, a possibilidade constante de passarmos a ser apenas uma memória naqueles que nos rodeavam. A verdade é que nos é difícil aceitar que um dia iremos morrer e que um dia poderemos ter de conviver com a separação que a morte provoca.
 Apesar de tudo, e por difícil que a morte seja de aceitar, parece-nos ser mais fácil ter uma atitude resignada e menos dorida perante ela quando a mesma acontece em pessoas que viveram uma longa vida. Sentimos que aquele ser cumpriu a sua viagem neste mundo e que agora pode partir sem deixar grandes sonhos por viver. Foi uma vida que chegou à sua meta e que agora se apaga. Não quero com isto dizer que seja fácil. Apenas considero que é mais fácil aceitar esta lei da vida e, a seu tempo, realizado o luto necessário, abandonar a dor lancinante e dar lugar a um sentimento mais doce e resignado. Contudo, quando o fenecimento se dá em pessoas que ainda tinham muito para viver, muito para dar, sentimos que o chão nos foi roubado. A aparente segurança com que conseguimos viver, afastando de nós a ideia da morte, ignorando-a, é-nos roubada quando uma vida jovem é ceifada. Sei que tais mortes nunca são resolvidas no nosso íntimo. Nunca nos abandona esta sensação que muito ficou por dizer, muito ficou por sentir, muito ficou por viver. No fundo fica uma sensação de vazio, uma sensação de vida inacabada, uma sensação de vida não cumprida.
Ainda assim, e com a inexorabilidade da passagem do tempo, a dor vai ficando mais ténue. Reaprendemos a viver, convivendo com a ausência da pessoa que nos deixou. A mágoa vai ficando mais lá no fundo, tapada por camadas de aceitação, por algum esquecimento e pelo surgimento de um novo sentimento, ajudado pelas memórias deixadas por quem partiu: uma saudade que nunca nos abandonará mas que se vai tornando mais tolerável, mais doce, menos devastadora. A nossa vida, porque assim é a lei da vida, sobrepõe-se à vida perdida. E é essa força, que alguns de nós desconhecem possuir, que nos permite continuar a viver, independentemente da perda de entes queridos.
As últimas semanas têm sido negras…demasiado negras para o país. Em 15 dias perdemos três nomes maiores de áreas variadas. E, quando o país pensava que já chegava de notícias tristes, somos assombrados a meio de uma tarde de 5ª feira com mais uma fatídica notícia: desta feita foi o Zé Pedro que decidiu dizer farewell e nos deixar. É uma notícia dura. Ainda que fosse esperada, é uma notícia difícil de receber, de aceitar e de compreender. Mais um artista que, por morrer tão jovem, muito deixa por viver, por cumprir e por sonhar.
Todos os dias morrem pessoas. Sabemos isso. Mas quando morrem pessoas que, de alguma forma se encontram mais próximas de nós, é-nos substancialmente mais difícil ignorar esta realidade. Os Xutos & Pontapés e a figura do Zé Pedro acompanharam-me durante a minha infância, como uma das poucas bandas portuguesas com sucesso. Acompanharam-me no meu tempo de estudante: Queima das Fitas sem Xutos não era Queima. Acompanharam-me ao longo dos anos que se seguiram como a banda que mais vezes vi ao vivo em tantas cidades deste país. Concertos inesquecíveis, em que se estabelecia entre a banda e o público uma simbiose perfeita! Em todos eles, uma das imagens que ficava: o gosto de estar em palco e o sorriso eterno do Zé Pedro.

O facto é que o Zé Pedro abandonou o palco. E todos nós sentimos que perdemos um dos nossos, um dos que nos faz ter orgulho em ser português. E por isso digo que esta é a hora do país exprimir a dor, de se despedir de quem nos abandona tão precocemente, de cumprir o luto, de acalentar a dor. Só assim daremos lugar às memórias doces que a seu tempo chegarão.

terça-feira, 28 de novembro de 2017

http://p3.publico.pt/actualidade/sociedade/25058/sacrificar-se-em-prol-de-uma-relacao-benefico-ou-perigoso

Sacrificar-se em prol de uma relação… benéfico ou perigoso?
Penso que todas nós, mulheres, ouvimos, uma ou outra vez na vida, provavelmente das nossas mães ou das nossas avós, que o amor exige sacrifícios. Os livros que lemos, os filmes que vemos, todas as narrativas pelas quais passamos, também difundem, de um modo geral, a ideia de que as relações exigem sacrifícios. E não me passaria pela cabeça negar esse conhecimento milenar. Para um relacionamento correr bem, seja ele amoroso ou apenas de amizade, há que aprender a fazer cedências, há que procurar esquecer que existe um “eu” e um “tu” e procurar pensar em termos de “nós”. No fundo, há que sacrificar um pouco do “eu”, para se criar algo novo e maior que será o “nós”. E nada disto estaria errado, quanto a mim, se, por vezes, não levássemos tão a peito essas palavras e passássemos a encarar o viver, o amar e o gostar como uma longa viagem em que nos anulamos (a nós, aos nossos desejos e vontades) em função de um “tu” que não sacrifica nenhum pedaço de si próprio.
O facto é que nem sempre a culpa está do lado daquele que não realizou grandes sacrifícios, não abandonou grande parte das suas características em função de um “nós”. A verdade é que existem pessoas que vivem, ou sobrevivem, pautando as relações que desenvolvem por este modo de estar que é o de sacrificar-se pelos outros. O seu lema de vida é abdicar de si mesmo para fazer os outros felizes. Ora, tal forma de agir nunca poderá ter resultados positivos em qualquer tipo de relação (amor, amizade ou até profissional).
A primeira ideia que nos surge é que estes indivíduos com tendência ao sacrifício são demasiado bons para viver neste tipo de sociedade. Contudo, penso que não será bem assim. Pelo contrário, penso que são pessoas cuja companhia, a médio e longo prazo, se tornará pesada, difícil de suportar, criando uma relação nefasta que suga a energia. Vejamos:
Muitas dessas pessoas sacrificam os seus pensamentos, os seus ideais, a sua forma de ver e pensar a vida com o único intuito de evitar conflitos e discussões (isso poderia ser positivo, certo?) Porém, sabemos de antemão que, por um lado, a discussão é inevitável e que mais cedo ou mais tarde ela chegará (e quanto mais adiada, maior serão as proporções da mesma); por outro lado, sabemos que é da discussão que vem a luz. O facto de não partilhar as mesmas ideias, de as contrapor, leva ao surgimento de uma nova luz sobre o assunto que era debatido. Grande parte das vezes, um consenso é atingido perante este debate e esta argumentação. O facto de nada ser discutido leva a que numa relação onde deveriam existir dois seres pensantes, apenas exista um. E isso em nada é benéfico.
Por vezes o sacrifício surge com o intuito de ajudar o outro a atingir as suas próprias metas e os seus próprios objetivos. Gosta-se tanto do outro que quere-se a todo o preço que ele seja feliz, ajudando-o na prossecução dos seus sonhos. Quantas vezes assistimos a isso num casal? O problema, neste caso, é que as pessoas com tendência ao sacrifício esquecem-se e anulam-se a si próprias, olvidam-se das suas próprias vontades em prol de um outro que persegue os seus sonhos. Pergunto eu: um ser que anula as suas próprias vontades, anulando-se a si próprio, simultaneamente, será uma pessoa interessante? Penso que não. A mim parece-me mais uma marionete que tenta dançar ao som de uma música que não lhe agrada particularmente mas que é aceite, apenas porque o outro a escolheu.
Por fim, verifico que essa tendência para o sacrifício vem muitas vezes acompanhada de exigências. As pessoas sacrificam-se esperando que do outro lado o outro faça o mesmo. No fundo esperam algum tipo de compensação pelo sacrifício. Encaram as relações como transações em que dão muito para receber muito também. É claro que a maior parte das vezes não recebem na medida do que dão, não recebem à medida do sacrifício que fizeram, e por isso sentem-se frustradas. E aí chegam as acusações: “dei-te tanto e não recebi nada”, “eu dei-te tanto, não merecia isso”.
Como referi, é possível encontrar esse tipo de relação não apenas em relações amorosas mas em quase todo o tipo de interações sociais. Quantas vezes vemos, num casal, um dos membros se esquece totalmente de si em função do ser amado? Quantos trabalhadores querem tanto o sucesso da empresa que se esquecem deles próprios enquanto seres humanos e com família? Quantos pais querem tanto a felicidade dos filhos que se esquecem que também eles são humanos, que também eles têm objetivos a atingir e também eles têm sonhos que querem realizar? E poderia continuar a citar exemplos…

As razões para este tipo de sacrifício podem ser muitas: um momento da vida em que se sentem mais esgotados, uma autoestima mais reduzida, um relacionamento com uma pessoa demasiado exigente e pouco dada a sacrifícios, … O certo é que o resultado será, mais cedo ou mais tarde, sempre o mesmo: Pessoas cansadas, profundamente esgotadas, na medida em que dão muito e recebem muito pouco. Chega o momento em que se percebe que aquela relação baseada nos sacrifícios de apenas uma pessoa está em risco porque traz pouco de positivo para ambos. É uma relação difícil e esgotante tanto para quem se sacrifica como para o outro. E aí impõe-se a questão: de quem é a culpa? A culpa é daquele “tu” que não sacrificou nenhum pedaço de si próprio ou daquele “eu” que decidiu apagar-se, diminuir-se, em função de uma relação pouco proveitosa?

segunda-feira, 20 de novembro de 2017


http://p3.publico.pt/actualidade/educacao/25009/somos-todos-professores-miseraveis

(Em jeito de resposta à intervenção do Rodrigo Moita de Deus no programa "O último apaga a luz"

Somos todos professores miseráveis
Assumo que fiquei maravilhada com o brilhantismo da intervenção de Rodrigo Moita de Deus, no programa “O último apaga a luz” na RTP3. Para contextualizar estas minhas palavras, destaco, algumas das ideias chave deste “grande senhor”. Segundo ele:
-a greve só prejudicou as crianças. Estou totalmente de acordo consigo, senhor Moita de Deus. Onde é que já se viu uma greve que prejudica alguém? Não basta os professores serem “prejudicados” (em função de uma causa em que acreditam), perdendo um dia de salário? Se a bendita greve tivesse sido organizada para uma 6ª feira, ou uma segunda-feira, lá teríamos as vozes sábias, como a deste senhor, a dizer que apenas se organizam greves para que os professores tenham direito a um fim-de-semana prolongado. Aquela cambada de inúteis faz tudo para não trabalhar! Mas, infelizmente para as vozes que já estavam prontas para atirar estas palavras venenosas, a greve foi marcada para uma quarta-feira. Não podendo afirmar que procuraram o fim-de-semana prolongado, atiraram para outro lado. “Tenham vergonha, que estão a prejudicar as crianças!” Surge-me algumas dúvidas: o direito à greve, consagrado na Constituição da República Portuguesa, foi revogado e eu não percebi? Todos sabemos que uma greve irá sempre ter como consequência pessoas prejudicadas. Acontece assim com os médicos, acontece assim com os enfermeiros, acontece em qualquer setor de atividade. Mas será que os professores por terem os alunos como público não podem fazer greve? Afirmações destas parecem-me quase pueris.
Outra pérola que retive desta intervenção foi o que consideraria quase como uma máxima a relembrar: os resultados miseráveis dos alunos devem-se aos professores miseráveis que temos em Portugal. Mais uma vez terei que concordar com este senhor. Somos miseráveis em muitos aspetos. Miseráveis pela forma como somos tratados pelos sucessivos ministérios, miseráveis por cada vez menos dignificarem aqueles que se dedicam ao ensino, miseráveis por sermos obrigados a ser professores e burocratas, atolados em papeis e papeis, miseráveis por muitas vezes sermos obrigados a lidar com a violência por parte dos alunos, quando a mesma não chega por parte dos próprios encarregados de educação. Já no que aos resultados diz respeito…sublinho que colocar a culpa dos maus resultados apenas e só nos “professores miseráveis” é uma visão de quem não está no sistema, de quem não percebe do que está a falar e de quem apenas pretende pôr a culpa de tudo nos professores (maus resultados, défice e quiçá a seca). Desresponsabilizar os alunos nestes maus resultados é, mais uma vez, uma atitude pueril e pouco conhecedora.
Continuando na série de barbaridades que se conseguiu dizer em tão pouco tempo, o senhor, que se afirma cansado de ouvir falar dos professores, declara que se vê na obrigação de colocar os seus filhos no ensino privado. E faz muito bem. Ouvi dizer que os professores que trabalham no ensino privado (contra os quais nada tenho a referir, note-se) se formaram todos eles nas universidades de Harvard e Cambridge. Deixando-me de ironias, questiono: afinal em que universidades e/ ou escolas superiores de educação estudaram os professores do ensino privado? Não estamos a falar da mesma formação base? O que se passa depois da formação? A escola pública tem algum vírus que se propaga entre os professores do ensino público? Acredito é que, na sua visão, eles são de longe melhores profissionais que a corja que trabalha no ensino público uma vez que os mesmos não fazem greves em dias de semana e não incomodam, perdão, não prejudicam as crianças.
Ainda nessa intervenção se levanta a questão: afinal para que serve todo o dinheiro investido na educação? De acordo com Moita de Deus, para benefício dos professores, que nem estão nas aulas e por isso enviam os alunos para as explicações. Pergunto eu, onde estamos nós se não estamos na sala de aula? É que do trabalho que eu desenvolvo, nunca me foi retirada uma hora que fosse do meu trabalho letivo para estar noutro local que não na sala de aula. Pelo contrário, muitas vezes me foram acrescentadas horas supostamente não letivas, com trabalho em sala de aula, desenvolvendo trabalho com alunos! Para além disso, sim, trabalhamos muito fora da sala de aula. Muitas reuniões para pôr em prática projetos, planos, atividades…um sem fim de reuniões para um sem fim de assuntos…tudo em horário fora do que é considerado hora letiva, como é óbvio!

Concluindo, o senhor R. Moita de Deus diz-se cansado das discussões apenas e só sobre professores: se eles estão ou não contentes, se estão satisfeitos com o rumo que a sua carreira está a levar, com o seu, digo eu, egocentrismo. Não perceber que o mau estar generalizado que se sente na classe dos professores é prejudicial a todos os agentes da educação, não perceber que somos uma classe com um nível elevadíssimo de síndrome de burnout, não procurar as razões para este nível elevadíssimo e limitar-se a declarar-se “cansado de ouvir falar dos professores” demonstram que esta intervenção, para além de desnecessária, não traz qualquer luz à discussão, limitando-se a um único objetivo: incendiar a opinião pública. 
http://p3.publico.pt/actualidade/sociedade/25006/entre-ricos-e-pobres

Entre ricos e pobres…
Podes tirar a pessoa da pobreza mas nunca poderás tirar a pobreza da pessoa. Vi esta frase, no outro dia, pintada numa parede a assumo que a mesma me fez imenso sentido.
No decurso da nossa vida, cruzamo-nos com muita gente. Gentes diferentes, é claro (o interesse do contacto com as pessoas advém dessa possibilidade de conhecer pessoas completamente diferentes, certo?). Nessa diversidade, encontramos pessoas que são luz e energia positiva, pessoas impregnadas de sentimentos bons e que são, por isso, seres que apreciamos ter ao nosso lado, de ter por companhia. Pessoas ricas de conteúdos bons, positivas, acima de tudo, com elas, com os outros e com o mundo que as rodeia. E por serem tão ricas de conteúdo carregam com elas um porte, uma nobreza de ser e estar que dinheiro nenhum poderia comprar.
Por outro lado, encontramos o oposto destes seres de luz e de energia positiva. Pessoas sombrias, negativas e feias que parecem incomodadas pela vida e com a vida e que, por isso, procuram incomodar todos aqueles que os rodeiam para assim se sentirem acompanhados na sensação de miserabilidade que sentem. São pessoas pobres em sentimentos belos, pobres em sentimentos perfeitos, pobres em energia positiva, pobres, para não dizer paupérrimos, daquelas coisas que fazem bem ao coração e à alma. E, ainda que estas pessoas possam ser ricas, a um nível monetário, a verdade é que a pobreza nunca sai delas e da sua forma de ser.
E é por isso que alguém escreveu naquela parede, e muito bem, que não se pode tirar a pobreza da pessoa. Existem pessoas por este mundo que, ainda que tenham o seu saldo bancário bem mais elevado que a maioria dos “comum dos mortais” que com elas se cruzam, não conseguem ser ricas. A pobreza simplesmente não lhes sai do sangue. Mentes pobres que acreditam que o dinheiro pode tudo, que o dinheiro lhes permite tudo. Ricas em inseguranças e medos, usam o dinheiro para os disfarçar. Pessoas que procuram adquirir tudo o que tenha um preço, provavelmente para preencher vazios existentes naquelas vidas. Vidas vazias também de sentimentos bons e, por isso, vidas vividas sozinhas, num abandono comprovado pelo facto de não conseguirem cultivar amizades ou qualquer tipo de relações positivas. São pobres nas relações sociais: colegas, amigos, família…porque tudo está rodeado de um halo escuro e negativo que leva a relações fracassadas, erradas e pouco compensatórias. De um modo geral, são pessoas muito sozinhas. Mentes atormentadas pelo negativismo, pela toxicidade que emanam, levam a que os outros se afastem delas. Pessoas pobres de tudo o que seja positivo.
A riqueza de que falo nada tem a ver com o saldo da conta bancária, como penso que está claro. É uma riqueza de ser e não uma riqueza de estar. Esta “fortuna” faz com que, por pior que sejam as situações, elas sempre são enfrentadas com um sorriso no rosto, com um sentimento de esperança que o dia de amanhã será melhor, com uma força e uma resiliência que dificilmente poderá ser quebrada. A riqueza interior da pessoa fá-la-á considerar qualquer situação como um desafio que pode e deve ser superado. A pessoa rica procura relações sociais compensatórias para ambos os lados, procurando que os benefícios daquela sejam elevados para ambos os membros. Pessoas que deixam um rasto luminoso ao longo da sua trajetória de vida porque procuram ser luz para a vida que levam e para as pessoas que as rodeiam.

Uma pessoa pode sair da pobreza sim mas a pobreza nunca abandonará certo tipo de pessoas. O mesmo sucede com as pessoas que denomino de ricas. O seu ser, o seu estar, estará sempre do lado da riqueza quer a sua conta bancária esteja recheada ou, pelo contrário, completamente vazia. A nossa essência é aquilo que nos caracteriza. Podemos tentar alterá-la, limá-la, lapidá-la…mas a nossa base será sempre a mesma. Por isso existirão sempre os ricos e os pobres, de alma e espírito, por isso existirá sempre luz e escuridão, por isso existirá sempre o bem e o mal. E por isso, quem nasceu pobre de luz será sempre pobre…a sua alma nunca terá brilho quer se encontre no lugar mais pobre do planeta ou quer se encontre na maior mansão imaginada…

quarta-feira, 15 de novembro de 2017


Lá fora chove…
E hoje, talvez porque lá fora se ouça o som da chuva, porque as noites começam a ficar mais frias e já se necessita de mantinha ou apenas porque sim… a verdade é que hoje se apoderou de mim um sentimento de nostalgia, uma quase tristeza que me deixa de lágrima no olho sem ter nenhuma razão em particular…O aperto no peito, o coração acelerado, a respiração alterada já vão sendo habituais em fins de dia…vá-se lá saber porquê... O stress acumulado ao longo dos dias, as preocupações de que não te consegues desligar, aqueles “probleminhas” que, por não estarem resolvidos, te vão moendo…ainda que nada possas fazer para lhes dar um fim, poderão ser razões para este mal-estar. Mas hoje, a somar-se ao aperto do peito, existe uma espécie de tristeza doce, sem explicação que leva a este estado de melancolia que exige chá, reflexão, escrita e/ou leitura. É nesses dias e nesses momentos que paro para pensar na vida que levo, na vida que queria levar, no que deu certo e no que deu menos certo.
E sim, sempre que este estado de melancolia se instala, sempre que paro para pensar na vida, penso, também em ti. Embora lute contra, a verdade é que a memória de ti vem à tona. Deverias estar ultrapassado há muito. Deverias ser uma recordação doce e amena. Mas não és. O ter aceitado isso foi das melhores opções que poderia ter tomado na minha vida: aceitar que esquecer-te é quase impossível e que, como tal, terei de conviver com a ideia do que podia ser e não é. Por isso o problema não é tanto o continuar a pensar em ti. Nem é tanto a noção que, apesar da distância que nos impusemos, continuamos a sentir falta um do outro, continuam os corpos a estremecer quando um vislumbra o outro, continuamos a sorrir com os olhos quando nos encontramos. Não é tanto a noção que nunca nos sentiremos totalmente completos nem totalmente felizes um sem o outro. Com esses pensamentos e essas certezas eu já aprendi a viver. O problema está nos dias em que os meus olhos se abrem para a realidade e percebem que ainda que tudo isso exista e persista, estamos destinados a não ser.
 Sou aquela pessoa positiva, que acredita sempre que o melhor está para vir e que os sonhos se concretizam, mais cedo ou mais tarde. Não quer isto dizer que seja totalmente irracional. Sonho e continuo a sonhar porque sei que alguns sonhos precisam de muito pouco para se realizarem. E por isso, como diz a canção, “vou tocando em frente” à espera de melhores dias, à espera da realização dos sonhos, à espera de felizes reencontros, à espera que, finalmente, se cumpra o futuro adiado. E assim se vai vivendo, sem grandes sofrimentos, com alguma serenidade adquirida a pulso. Contudo…há dias em que a realidade se abate sobre mim, em que a serenidade desaparece, em que sinto que nada disto faz sentido, em que sinto que existe um lugar vago nesta sala e debaixo desta manta que devia estar ocupado mas que, provavelmente nunca estará. É nesses dias que encaras a realidade de frente, sem máscaras, sem filtros, e percebes que ainda que sintas que ali tão perto está a tua alma gémea, ela não está no corpo e nas circunstâncias adequadas para que te possa acompanhar nesta vida. É, como se diz no português comum, o momento “em que te cai a ficha”, o momento em que percebes claramente que por mais que continue a haver um sentimento grande, uma atração enorme e uma imensa certeza que podia (e devia) ter dado certo, esta não será uma história com reinício, não será uma estória para ser vivida… E é neste momento que se abate sobre ti uma certa tristeza, não uma nostalgia do que já foi, mas a tristura e a angústia de ver esfumar os teus sonhos em nada, na certeza do que nunca será.
Lá fora continua a chover. É uma daquelas noites que podem trazer a serenidade ou a melancolia. Hoje instalou-se a melancolia porque há dias em que a esperança se torna pequenina, um pequeno grão de pó que não pode suster qualquer sonho por mínimo que seja. São os dias da racionalidade. Dias que fazem passar um pano frio sobre os pequenos sonhos que se vão acalentando. Dias (ou noites, neste caso) que fazem desaparecer as pequenas esperanças que têm sobrevivido ao longo deste tempo tão longo. Sinto um vazio…provavelmente criado pelo desaparecimento dos sonhos….um vazio que necessita de ser preenchido. Como? Escrever, ler…ocupar o espírito. Recordar, como se de um mantra se tratasse, que Amanhã é outro dia tal como dizia a tua heroína de E Tudo o Vento Levou, Scarlett O’Hara.

Sabes, como já aconteceu tanta vez, que irás dormir, esperando que a noite te traga um dormir sem sonhos. Mas sabes, também, que amanhã acordarás de alma renovada, com o sol a brilhar na janela, e o renascimento dos sonhos de sempre levará pouco mais de uma manhã para se voltar a dar…

terça-feira, 14 de novembro de 2017


Halloween terminado, S. Martinho concluído, venha daí o Natal!

Temos assistido, ano após a um progressivo afirmar de uma tradição proveniente, maioritariamente, dos países anglo-saxónicos, o “Halloween” em detrimento de uma tradição mais portuguesa, o “Pão por Deus”. Penso que esta situação é um sinal dos tempos, sinal de um mundo cada vez mais aldeia global e penso que, por essa razão, não vale a pena nos aborrecermos com estas evoluções.
 Findo o Halloween e os seus festejos, e tendo em conta a proximidade das datas no calendário, começamos a pensar no S. Martinho. E aí, sim, colocamos em prática as tradições que conhecemos de sempre. A mais importante: organizamos magustos, porque em dia de S. Martinho devemos comer castanhas e elas sabem bem melhor quando assadas num pouco de caruma! Aproveitamos a ideia para reunir à volta de uma fogueira – que já vai sabendo bem - amigos e família. Bebemos, como se impõe, a jeropiga ou a água-pé. Quem produz vinho, vai à adega e prova o vinho (Eu provei!). Concluindo: celebramos o dia como sempre nos lembramos do celebrar!
E, dia de S. Martinho terminado, é claro que começamos a pensar na próxima festividade a fazer a sua aparição no calendário. E sim, é claro que o final do dia 11 de novembro marca o fim do dia de S. Martinho e assinala o regresso, com toda a pompa e circunstância, de mais uma época natalícia!
Quais são os primeiros sinais de que o Natal está a chegar? Sem dúvida, os centros comerciais e as suas lojas. Diga-se, em abono da verdade, que algumas lojas não esperaram sequer o fim do Halloween, quanto mais do S. Martinho, para colocar à venda a parafernália de coisas que têm para vender sobre o Natal. Mas, a grande maioria começa as decorações e a colocar à venda tudo o que possa ser adquirido como prenda natalícia, no fim-de-semana que se segue ao S. Martinho.
Um sinal de que o Natal não demora muito mais a chegar encontra-se, também, nos hipermercados. De um momento para o outro essas catedrais do consumo enchem-se de paletes e paletes de um velho nosso amigo regressado de férias: o Ferrero Rocher. Com ele traz sempre a companhia de uns magníficos Rafaellos e uns Mon Chérie. Encontraremos, junto dessas vedetas, outros chocolates: Pais Natal de todas os tamanhos e para todos os gostos, caixas de chocolate sortidas, pequenas, grandes, enormes, chocolates, chocolates, chocolates. Uma forma subliminar de nos dizer: “está oficialmente aberta a temporada que te permite comer chocolates de forma impune em quantidades dignas de um gigante”.
Nesta “abertura oficial da época natalícia” é típico encontrarmos as campanhas, mais uma vez, dos hipermercados que tentam escoar os brinquedos que não venderam o ano passado, colocando tudo com desconto de 50%. E aí assistimos ao verdadeiro espírito natalício. Os carrinhos de compras a transbordar de caixas enormes que custaram um “quase nada” – afinal tudo está com desconto de 50%. Compra-se desalmadamente. Tudo está barato. Não se sabe bem a quem dar determinado brinquedo que se adquiriu mas ele estava tão barato que tinha de ser comprado! À última hora aparece sempre alguém a quem oferecer. E aí assiste-se às primeiras filas de Natal: filas gigantes nas caixas para pagar, filas gigantes para embrulhar o castelo de brinquedos que se acabou de adquirir, filas gigantes para sair do hipermercado porque afinal todos pensaram em aproveitar esta loucura de fim-de-semana a 50%. Assiste-se, também, aos primeiros arrufos, dignos da quadra natalícia: porque o senhor levou o brinquedo onde eu já tinha colocado a mão; porque o senhor deixou o carrinho a marcar lugar na fila e isso não é possível; porque o senhor tem muitos embrulhos para fazer e tem uma série de pessoas à espera,… toda uma série de acusações que demonstram que a época natalícia traz à superfície o que de melhor há em nós!
Típico da época natalícia, e que já se iniciaram, pé ante pé, sobretudo aos sábados de manhã, são os intermináveis anúncios de brinquedos. Ele há-os para todos os gostos: da boneca que anda e corre, a que fala, a que faz tudo, ao gato que parece quase verdadeiro (que brinquedo tão triste!), aos brinquedos de sempre: Playmobil, Barbies para todos os gostos e feitios, Legos…Brinquedos, brinquedos, brinquedos, que fazem sonhar as nossas crianças e que nos fazem ter pesadelos tal a quantidade de publicidade.
Nesta época também já não nos é possível passar sem duas figuras incontornáveis do panorama português: a Popota e a Leopoldina. Também elas regressam, inevitavelmente, no mês de novembro. Coloca-se a questão: será que a Leopoldina irá vender algo novo este ano? A causa da Leopoldina, como sempre, será nobre, o que nos irá levar a adquirir mais uma lata de bolachas, mais uma manta de que não precisávamos mas…é para ajudar (dizemos nós para nós!). E a Popota? Estará ela ainda mais “exemplarmente magra”? Estará Popotíssima? Mal podemos esperar para ver! E quem irá acompanhar estas duas senhoras? Claro, o gordo vestido de vermelho e barbas brancas, com a sua imagem inventada pela Coca-Cola, em cada esquina e em cada lugar. Uma imagem reproduzida à exaustão servindo fins publicitários, ajudando à venda de um qualquer produto, ou ainda pousando no seu cadeirão para tirar fotografias com as crianças. E para quem tem crianças pequenas lá virá a trabalheira de explicar que aqueles gordos, por vezes pouco gordos, mais não são do que figurantes. O verdadeiro, esse, só chega na véspera de Natal, à meia-noite, como sabemos.
A época que se inicia com o fim do S. Martinho é ainda caracterizada por toda uma série de luzes e brilhos de sonho. Não tardarão as ruas decoradas com motivos natalícios, não tardarão as árvores cheias de luzinhas, não tardarão os presépios espalhados pelas cidades, pelas rotundas, e não tardarão as famosas vilas e aldeias natal que vão proliferando por esse país fora. Assumo que gosto das decorações e que gosto dessas aldeias e vilas criadas para serem de sonho!
E tudo isto se irá passar ao longo destes meses de novembro e dezembro ao som de umas “Christmas Carols” que conhecemos desde sempre que chegam quase a enlouquecer-nos por tocarem, o dia inteiro, pelas ruas onde nos passeamos e por muitas das lojas por onde entramos. E na rádio passarão os já considerados clássicos desta época: Last Christmas, dos Wham, Something About Christmas Time, do Bryan Adams, Driving Home for Christmas, do Chris Rea, o All I want for Christmas is you, da Mariah Carey  ou ainda o Thank God it’s Christmas, dos Queen, entre muitos outros clássicos de Natal…

Por fim Do they know it’s Christmas da Band Aid (a versão de 1984, claro) irá, como sempre, passar na rádio, e como sempre irei cantá-la a plenos pulmões, procurando imitar o tom e a voz de cada um, num verdadeiro “momento karaoke”. E será nesse momento, como acontece há muitos anos já, que sentirei que, apesar de perceber o Natal como uma festa com pouco mais do que um monte de trocas comerciais, ele continua a ter, para mim, a sua magia e continua a trazer reminiscências da infância. Confesso que, acima de tudo, o Natal continua a oferecer-me uma sensação que não sei explicar mas que descrevo como uma sensação de calor e fé de que, nesta época, o amor pelas pessoas anda no ar e as coisas boas podem acontecer.

quinta-feira, 9 de novembro de 2017

A que sabe a tua infância?
Aqui há dias, tendo ficado hospedada em casa de um amigo, descobri à minha espera no quarto onde ia dormir dois rebuçados conhecidos como os Flocos de Neve. Imediatamente fui transportada para aqueles momentos em que, ainda criança, a minha avó me oferecia um punhado desses rebuçados que tão bem nos sabiam (e que continuam a ser do mais saboroso). Falando com outros amigos, percebi que essa memória dos Flocos de Neve, do seu sabor, da dádiva feita pelos avós, era uma memória comum a muitos de nós. E percebi ainda que, quando questionados sobre “a que sabiam”, ninguém possuía uma resposta clara sobre o seu sabor. De facto, a que raio sabem os “Flocos de Neve”? Para mim, apenas me surge uma resposta: sabem a infância e por isso gostamos tantos deles. Transportam-nos imediatamente para aqueles anos em que nos vestiam calças cuja cintura nos chegava quase às áxilas, ao tempo em que caçávamos grilos no campo e andávamos de bicicleta até ao pôr-do-sol, ao tempo em que assistíamos ao “Verão Azul” e ao Tom Sawyer, ao tempo em que sentávamos nos passeios de uma rua, à noite, em amenas “cavaqueiras” ou jogávamos ao esconde-esconde. No fundo, transporta-nos àquele tempo em que éramos infinitamente felizes e nem tínhamos noção disso.
No meu caso, não posso dizer que apenas os Flocos de Neve me transportam para um passado que a cada dia que passa se torna mais longínquo. Existe uma série de alimentos e guloseimas que ainda hoje aprecio e que me trazem aquela sensação reconfortante de encontrar um velho amigo e que nos dá um abraço apertadinho!
No que às guloseimas diz respeito, assumo que muitas das recordações são francesas. Sou uma apreciadora de gomas mas nada, até hoje, conseguiu superar as famosas (pelo menos em França são) Fraise Tagada. As sacanas sabem tão bem que é difícil nos ficarmos por duas ou três, apenas. Único defeito: serem quase impossíveis de encontrar em território nacional!
Ainda no capítulo guloseimas destacaria o belo do suspiro. Este, felizmente, encontramos em Portugal sem grandes dificuldades. Contudo, tenho bem claro que estes pedaços de céu me foram apresentados por uma tia-avó, enquanto vivia em França, que tinha sempre em casa um saco dessas pequenas maravilhas. E, sempre que os como, sinto que reencontro, do outro lado da estrada, aquela criança pequena maravilhada com o primeiro suspiro que comeu.
Outra das maravilhas da minha infância: uns aromatizadores concentrados que vinham numas latas para misturar com água! O de menta, principalmente, era de “beber e bradar por mais”! Qualquer “aguita” sabia melhor com esse fantástico elixir! Na categoria bolos como poderia eu não referir o “Pain d’épices”? Nunca entendi esse nome, uma vez que para mim se trata de um bolo de mel mas o que sei é que desde miúda adoro aquilo e ainda hoje, sempre que o encontro à venda, me delicio com ele.
E no campo de delícias da infância, como não falar da famosa Nutella? Sim, gosto e assumo que não como mais por saber que me poderá provocar uma borbulha ou duas para além da possibilidade de me engordar um quilo ou dois!! Nesse capítulo não poderei dizer que sou fã de uma marca que qualquer miúdo português adorava e venerava nos anos 80: o Tulicreme. Nunca apreciei e nunca aprendi a gostar dessa pasta estranha que tinha pretensões de um dia se tornar Nutella. Contudo, aprendi a gostar de uma verdadeira invenção portuguesa: o pão com manteiga e com cacau polvilhado por cima da manteiga. Meus amigos, é dos deuses. Comer algo assim é ser automaticamente transportada para aquelas tardes depois da escola (primária) em que o lanche contemplava essa enorme iguaria. Próximas dessa “invenção estranha” estão as fantásticas torradas feitas pela avó ao lume. Que bem que sabiam!! Quando eram feitas com pão caseiro então (amassado pela avó e cozido em forno de lenha) tornavam-se dignas de um pequeno-almoço ou de um lanche mas facilmente poderiam passar à categoria de jantar, uma vez que nos sentíamos imensamente saciados com apenas uma torrada. Nada sabe tão bem quanto uma torrada feita em cima de brasas, degustada no inverno, junto à lareira. Não aprecio o inverno mas esta é uma das memórias que me fazem ansiar por dias mais frescos. No capítulo, alimentos confecionados pela avó teria de referir as batatas fritas em azeite! Que coisa tão diferente. Que luxo!! Há anos que não como mas que bem que sabiam! Pensar nelas é pensar na minha avó Antónia sentada à beira do lume a fritar as batatas, em azeite, num lume brando! E lá vem a pontada da saudade!...
E deixei para o fim uma das coisas que mais apreciava – tinha um primo que me acompanhava nesse gosto um tanto ou quanto estranho – que era o de comer às colheradas o leite em pó. Será que ainda existe esse leite em pó? Curiosamente, era um dos produtos que os emigrantes traziam para os seus familiares quando vinham de férias: leite em pó. Porquê? Não sei. Mas sei que uma das coisas que mais prazer me dava era uma colherada daquele leite em pó que quase me fazia tossir quando o colocava à boca. E, enquanto escrevo estas linhas, assumo que sinto o sabor aflorar à minha boca.
Estes são os sabores da minha infância de que tenho saudades. Uns nunca mais comi porque desapareceram do mapa, outros não como porque os nutricionistas os desaconselham. Alguns poucos (pain d’épices, Nutella) como de vez em quando. E outros ainda, como os Flocos de Neve, cruzam a nossa vida de um momento para o outro e transportam-nos para este mundo de memórias saborosas e aconchegantes de produtos e pessoas. A isto sabe a minha infância: a morangos Tagada, a pain d’épices, a suspiros, a torradas de lume, a batatas fritas no azeite, a leite em pó às colheradas. E a tua infância, a que sabe?

sexta-feira, 3 de novembro de 2017




“Fofinha é a tua almofada!”

http://p3.publico.pt/actualidade/sociedade/24911/fofinha-e-tua-almofada#.WfyxqKaKiCk.facebook

Assumo que não sou a típica mulher romântica, que lê poemas de amor sempre que pode, que fantasiou ou que fantasia com o casamento fabulosamente feliz, que sonha com o homem que estará sempre ao meu lado para executar as tarefas mais complicadas e que se derrete perante um ramo de flores. Acredito que haja muitas mulheres que sigam esse padrão... …mas eu não…E acredito que existam outras tantas que, tal como eu, o abominam…
A verdade é que existem algumas ideias pré-concebidas sobre as mulheres com as quais eu não me identifico e que me irritam. E assumo que quando digo que não gosto de algumas coisas, sou observada com um olhar desconfiado de quem pensa “Esta mulher é uma pedra sem qualquer tipo de sensibilidade!”
A primeira e a mais importante: não gosto de receber flores. Está dito! Abomino receber um ramo de flores. E quanto maior e mais faustoso ele for, pior. Não consigo gostar de flores. Rosas então…acho que é mesmo a prendinha última. Aquela prenda que nos diz “não faço a mínima ideia do que te oferecer mas ouvi dizer que todas as mulheres adoram flores, sobretudo rosas”. Pois eu digo: não aprecio. Gosto de girassóis. Um só, em jeito de surpresa, é tolerável. Mais do que isso, não! Não consigo olhar para um ramo de flores sem pensar: este ajuntamento de coisas bonitas e de cores vivas deve ter custado uma fortuna e daqui 3 dias estará no lixo porque estará já seco. Há coisas bem melhores, mais úteis e menos efémeras que possam ser oferecidas. Sim?
Outra coisa que não suporto e que muita gente acha que as mulheres adoram: aqueles termos supostamente carinhosos que te fazem pensar “ele acha mesmo que tu gostas de ser tratada assim ou sabe que desta forma não há forma de errar o teu nome?” Termos como “fofinha”, “queridinha”, “queriduxa”, “fofuxa”, “bebé” e outras que tais são completamente proibidos!!! Eu tenho um nome. Que tal gravares o meu nome na tua mente e passares a chamar-me assim? Aceito diminutivos, ou “petit noms” a quem me conhece há muito, a quem é meu amigo, às pessoas de quem gosto muito. Não sou contra um termo ou outro carinhoso mas não esses do “querida” e da “fofa” até porque isso não me caracteriza em nada. Não sou querida nem sou fofa. Fofos são a almofada e o colchão das pessoas!
Outro pormenor. Gosto de ler. Sempre gostei. E sou mulher… claro. Isso não quer dizer, como acham todos os vendedores das livrarias deste país que suspire e que goste das histórias de Nicholas Sparks. Conto na minha biblioteca pessoal um sem número de livros desse senhor que me foram oferecidos. Mulher leitora tem de gostar das histórias de amor e de drama do senhor Sparks. Pois eu acho que são do mais enjoativo, que não aportam nada de novo. Portanto, mais um aviso à navegação: nem todas as mulheres gostam do senhor Sparks, da Susana Tamaro, Paulo Coelho e outros que tais. Continuando no capítulo da leitura, assumo que não sou fã daquelas frases profundamente românticas que pululam no facebook. Enjoam-me. Não acho lindo, não acho romântico, acho brejeiro. Prefiro uma boa piada no momento certo. É bem mais romântico.
Há que chamar a atenção também para aquela mania que algumas pessoas têm em abusar, como costumo dizer, dos –inhos. O uso de diminutivos não torna a conversa mais romântica. Frases como “amorzinho (o horror!) queres um cafezinho e um beijinho porque estás com um ar tristinho” são extremamente irritantes…pelo menos para mim. E já que estamos nesse tema, aconselho a ter algum cuidado com a expressão “beijinho grande”. Não tenho nada contra a expressão “beijinho”. Até é simpática. Mas se é “beijinho” não pode ser grande, certo???
Por fim, sou mulher e que aprecia vinho. Há uma certa mania para achar que a mulher aprecia apenas vinho branco ou rosé (Verdade seja dita que à medida que envelhecemos se vai perdendo, aos poucos, esta ideia pré-concebida). Sim, gosto de vinho mas prefiro vinho tinto. Outra ideia pré-concebida: a mulher só gosta de bebidas doces. Sim gosto de licores mas não sou fã de uma amêndoa amarga ou de um Bailey’s. Prefiro um gin bem servido a qualquer licor. Mentalizem-se: cada mulher é uma mulher, com gostos e preferências diferentes!
Terminado a conversa que já vai longa…O que eu quis demonstrar, ao longo deste texto, é que não se pode considerar que por sermos mulheres somos todas iguais, apreciando as mesmas coisas. Somos seres únicos com gostos e vontades únicas. Não gostamos todas do mesmo. Nada tenho contra quem gosta de flores, quem gosta de “petit-nom” simpáticos, contra quem ama ser tratada por “fofinha” ou contra quem lê Nicholas Sparks e acompanha a leitura com um licor. Aceito que todos somos seres diferentes. E por isso, apenas peço que tenham em conta as diferenças que nos individualizam, que não nos tratem todas pela mesma medida até porque se torna pouco simpático e pouco dignificante. 

domingo, 29 de outubro de 2017


E já chegou o horário de inverno…
E esta noite (noite de sábado para domingo) dormi mais uma hora que o habitual. Quer isto dizer que quando olhei para o relógio, ainda com o cérebro entorpecido pelo sono e os olhos remelosos (Sim, porque ninguém acorda com o ar fresco de quem acabou de sair do banho) vi que ele, o relógio, assinalava 9 horas. E pensei…que maravilha! É domingo! Posso dormir mais uma horinha!! Contudo, o segundo pensamento foi: Afinal são 8 horas! Posso dormir mais duas horas!! Hoje é o primeiro dia do horário de inverno. Dito isto poderia pensar-se que gosto deste horário de inverno. Nada mais errado! Esse malnascido horário de inverno apenas tem um aspeto positivo (que bem vistas as coisas nem é assim nada de mais!): oferecer-me uma hora de sono extra, uma única noite no ano, num dia em que a mim nem me traz grandes benefícios (Não tenho o hábito (ou a necessidade) de levantar muito cedo ao domingo…)
Mas a verdade é que todos os anos eu tenho de passar por esta alteração horária. Todos os anos acalento, secretamente, a esperança que seja este o ano em que se decidirá pelo não à mudança para o horário de inverno mas, invariavelmente, todos os anos, vejo a minha esperança defraudada e a hora mudar: “Quando forem duas…atrase para a uma”. E eis que está dado o passo para que comecem os dias cinzentos, os dias frios, os dias pequeníssimos.
Procurando encontrar uma forma de gostar desta mudança horária, fui tentar perceber quais eram as razões inerentes a essa mudança de hora. Talvez a mudança tivesse uma explicação simpática. E ao que parece, tudo começou com uma ideia peregrina de Benjamin Franklin em 1784… Na altura a ideia surgiu com o intuito de poupar velas. Ainda assim, e pelo que fui lendo por aí, esta ideia apenas voltaria a surgir e seria aplicada em 1916, com o intuito, desta feita, de poupar carvão. A ideia era que não se desperdiçassem horas de luz durante as manhãs. As pessoas acabariam por levantar mais cedo, aproveitando, assim, melhor o dia. Com o início da Iª Guerra Mundial países como a Alemanha e a Grã-Bretanha adotaram este “Daylight saving time” (como ficou conhecido) a fim de se poder poupar e economizar tendo em conta o transtorno da guerra. Terminada a guerra, houve quem abandonasse a alteração de horário. O Daylight saving time foi retomado por várias nações, em 1939, demonstrando que um mal (2ª Guerra Mundial) nunca vem só… Mais uma vez, ao terminar a guerra, houve países que foram abandonando as mudanças de hora no horário de inverno e no horário de verão. E, pelo que fui lendo, andou-se assim um pouco ao sabor das ondas, até aos anos 70, data em que o Daylight Saving Time foi uniformizado tendo em conta as preocupações, mais uma vez económicas, que surgiram decorrentes dos obstáculos que os países árabes começaram a colocar na aquisição do precioso “ouro negro”. Pelo que entendi, a ideia foi sempre a de poupar… e não de fazer as pessoas mais felizes… No que aos países da União Europeia diz respeito, esta “tradição” mantém-se, até aos dias de hoje, devido a uma diretiva datada de 1981, que determina que os seus estados-membros devem entrar na hora de inverno no último domingo de outubro e na hora de verão no último domingo de março. E assim, de seis em seis meses, acontece-nos uma noite com mais uma hora (horário de inverno) e uma noite com menos uma hora (horário de verão). E, apesar de já ter passado por isto desde que me conheço por pessoa, ainda não me consegui habituar e muito menos consegui gostar desta mudança horária, sobretudo quando a mudança se faz para o horário de inverno.
Dou por mim a pensar: será que isto ainda faz sentido? Não poderíamos ficar eternamente na hora de verão? Será que este horário ajuda a poupar o que quer que seja? Tenho as minhas dúvidas, nos tempos que correm. O que sei é que a hora de verão é bem mais simpática! Ok, se a mantivéssemos levantávamos às 8 horas da manhã e poderia estar ainda um pouco escuro. Mas… “assim como assim”, é suposto os dias de inverno serem escuros e cinzentos. Não me incomodaria muito, penso eu, levantar e ainda ver estrelas no céu…rapidamente o sol iria levantar e o dia acordar! Agora o que consegue tirar-me do sério é ver que daqui mais uns dias serão 17 horas e já estará praticamente de noite! Os dias são minúsculos. As noites são intermináveis. Quem pode ter vontade de praticar desporto depois de estar escuro com breu? Quem pode ter vontade de passear, de fazer turismo? Basta um almoço um pouco mais prolongado para se perder a tarde toda e impossibilitar qualquer tipo de visita que tenha de se realizar na rua, sob a luz do sol. Parece-me que este horário demoníaco apenas se mantém para obrigar as pessoas a estar em casa. As horas de sol, efetivas, são muito poucas para mim. No horário de verão, terminamos o trabalho e temos tempo para apreciar o resto do dia, passear, ler um livro numa varanda, beber algo numa esplanada, ou até mesmo realizar as tarefas caseiras, aproveitando os bons pares de horas que ainda temos pela frente com luz solar. Tal é impossível no horário de inverno. O inverno é cinzento, escuro e frio. Este horário só ajuda a torná-lo ainda mais feio, ainda menos suportável. Não tenho base científica para o que vou dizer, mas acredito que as depressões sejam em maior número neste horário. Abomino esta mudança! Para mim é a verdadeira machadada no verão que já nos abandonou.
Se bem me lembro houve uns anos em que a mudança de horário não se verificou. Se a memória não me atraiçoa, lembro que no pico do verão eram quase 22 horas quando se dava o anoitecer. Isso agradava-me… e vivo na esperança que o mesmo volte a suceder.

Estamos em outubro, 2017. Ainda não foi este ano que cortamos relações com o horário de inverno. Hoje dormi mais uma hora…e hoje irei verificar que às 18 já não existirá sol…e durante os próximos 6 meses estaremos sob o domínio deste horário que nos obriga a conviver com a noite escura muitas mais horas do que aquelas que eu quereria e gostaria… Como disse, não gosto deste horário. Apresento o meu veemente NÃO! a esta alteração. E vivo na esperança que um dia se acabe com esta imposição do horário de inverno/ horário de verão. Terei, com toda a certeza, um nível ligeiramente mais elevado de felicidade!

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

http://p3.publico.pt/actualidade/sociedade/24851/reivindico-o-meu-direito-de-ser-infeliz#.WfHPtRVMS8M.facebook

Reivindico o meu direito de estar infeliz!
Sim, leram bem e não existe qualquer tipo de erro no título. Hoje não venho reivindicar o meu direito de ser feliz (que também tenho, é claro) mas sim o direito de estar infeliz. Tenho pensado ultimamente sobre esta questão até porque, sem nenhuma razão em especial, ou, eventualmente, por todas as razões possíveis, tenho-me sentido mais vezes melancólica. Não é uma tristeza a cem por cento, daquelas que nos fazem chorar o dia todo, nos fazem apreciar o facto de passar o dia todo em pijama a “sofazar”, a fim de nos sentirmos miseráveis, e nos fazem comer todo o tipo de porcarias. Não, nada disso. Apenas me sinto com uma sensibilidade mais à flor da pele, uma impaciência a um nível maior do que é habitual, uma menor tolerância para com as situações e as pessoas, um modo menos expansivo de ser e estar …no fundo, aquilo que os ingleses sintetizam com um magistral feeling blue. E a verdade é que acho que tenho o direito de me sentir assim “menos bem”. E foi por causa deste meu “estar” e do diálogo com alguns amigos sobre este assunto que comecei a ponderar sobre este direito de ser/ estar infeliz e cheguei à conclusão que existe, à nossa volta, uma certa intolerância para com os menos felizes e, como tal, uma certa pressão para que as pessoas estejam sempre felizes.
Quando passamos por uma situação mais negativa é-nos permitido, pelas pessoas que nos rodeiam, termos o nosso momento de tristeza. É um facto. Mas, por pior que seja a situação – a pior – a morte de um ente querido –  ou outras situações menos agradáveis – uma situação de desemprego, o fim de uma relação, uma doença – o certo é que o momento de tristeza não se pode estender por um período de tempo muito alargado sob pena de as pessoas se começarem a afastar de ti. Não sabemos lidar com a dor, com a tristeza e com o sofrimento. Não queremos pessoas negativas. Pessoas que veem o lado mais negro da vida não são boa companhia! Como já referi, existe uma certa pressão da sociedade para nos mostrarmos sempre felizes. Essa pressão verifica-se na janela que todos (ou quase todos) temos aberta para o mundo: as redes sociais. Sim, poderá haver um dia em que iremos criar um post indicando que naquele dia não nos sentimos a 100%. Mas, no geral, o que iremos colocar naquela janela aberta para o mundo? Os momentos de felicidade, os momentos de festa, os momentos de alegria. (Ainda que muitas vezes esses momentos sejam, muitas vezes, apenas fictícios). Mostramos que somos fortes, que somos resilientes, que superamos as dificuldades. Sabemos que é isso que os outros querem ver. Sabemos que eles querem espreitar por cima do ombro, espreitar o mundo alheio e acreditar que ali não mora qualquer tipo de tristeza, mal-estar ou dor. Todos somos felizes neste mundo de faz de conta. E, quando pensamos no quão falsa é aquela vida retratada de um modo sempre tão feliz, defendemo-nos afirmando para nós mesmos: “não me quero expor”. E essa pouca vontade de exposição até faria sentido se não passássemos a vida a expor um lado da nossa vida – o luminoso –, guardando o lado mais sombrio (que sempre existe) para nós próprios.  
E hoje quero mostrar o meu total desacordo com esta situação. Quero ter o direito de estar triste. Quero ter o direito de chorar apenas e só porque me sinto triste nesse dia. E, como mulher que sou, nem preciso de razões muito grandes para ter vontade de chorar. Quero ter o direito de ter os meus momentos mais depressivos. Quero ter o direito de quebrar, de cair e, se necessário for, de me estatelar no chão. E quero ter o direito de lá ficar até que sinta forças para me levantar. Quero ter o direito de estar ali deitada até que sinta que a dor que se tornou suportável. Quero ter o direito de poder falar dessa tristeza, o direito de a partilhar como partilho os bons momentos. E, acima de tudo, quero ter o direito de poder contar com as pessoas que amo nesses momentos em que, provavelmente, menos o merecerei. Quero poder contar com eles até ter forças para superar esse estado de maior tristeza.
Temos que perceber que não existe a noção de felicidade se não existir a noção de infelicidade. Como poderia eu saber o que é ser feliz se não tivesse já vivido momentos de profunda infelicidade? Uma é o contraponto da outra. Uma não pode existir sem a outra. E, como tal, temos que perceber que esta caminhada que fazemos pela vida estará sempre recheada de momentos bons e momentos menos bons. Apenas temos que os aceitar sabendo que os bons não duram para sempre tal como os maus têm sempre um fim. Sabedoria popular e que tão bem define esta questão que é viver.

Sou uma pessoa feliz por natureza. De bem com a vida. Aceito o que ela me traz, normalmente, sem grandes dramas. Mas tenho os meus dias, os meus momentos, que se podem prolongar ou não, de maior tristeza. Momentos em que me sinto mais cabisbaixa, menos esperançosa com o mundo, mais melancólica. Existem dias cinzentos. Por vezes prolongam-se por várias semanas. Contudo, sabemos que cedo ou tarde, o sol, com a sua luz, virá. O mesmo se passa com os estados menos felizes. Por isso, exijo o direito de estar triste. Exijo poder sentir-me assim sem me sentir culpada por não estar feliz. Há que reconhecer que temos esse direito, reconhecer que precisamos da tristeza, da angústia, da desilusão, do desengano para percebermos os sentimentos de alegria, encanto, ilusão e felicidade. Seremos, com certeza, seres humanos mais equilibrados quando nos oferecermos o luxo de, por vezes, estar triste. Por isso volto a dizer que reivindico o meu direito de estar triste, pouco feliz, e não deixo que ninguém me o queira roubar.