segunda-feira, 31 de julho de 2017


Publicado em:  http://p3.publico.pt/actualidade/sociedade/24222/avos-os-de-ontem-e-os-de-hoje

Avós: os de ontem e os de hoje
Ontem, dia 26 de julho, foi Dia dos Avós. De ano para ano sinto que esta data se torna mais importante e mais pessoas a comemoram. Sentir-se-á aqui a influência, mais uma vez das redes sociais. De facto, Facebook e companhia começam por nos recordar que este é o Dia dos Avós. Em seguida, assistimos, nas redes em questão, a uma verdadeira enxurrada de mensagens de amor e saudade aos avós, notando-se que muitos já faleceram, e mensagens de reconhecimento pelo papel que tiveram nas vidas de quem escreve.
É um facto que hoje em dia existe uma data comemorativa para tudo e mais alguma coisa. E de facto há comemorações que são ligeiramente absurdas. Para não referir que existem comemorações que se repetem ao longo do ano levando a que se relembre e comemore a mesma coisa várias vezes no mesmo ano. Por exemplo, no Brasil e em mais alguns países, o Dia do Amigo comemora-se no dia 20 de julho. Como é o país irmão, em Portugal decidimos que até é giro dar um olá aos amigos nesse dia, em jeito de comemoração. Contudo, as Nações Unidas resolveram convidar todos os países para celebrar esse dia a 30 de julho. E nós celebramos mais uma vez a amizade, com um brinde nesse dia especial. Nada contra, até porque o povo português adora ter uma razão para comemorar. Mas a verdade é que se caiu num excesso. Todos os dias são dias de alguma coisa!
 Contudo, há dias que são, quanto a mim, importantes, e, portanto, devem ser lembrados e celebrados. O Dia dos Avós é um deles.
Não poderei dizer que me lembro dos meus avós apenas nesse dia… Apesar de já não estarem presentes na minha vida, nem no mundo físico, os quatro continuam muito presentes na minha memória e nas minhas saudades. A comemoração deste dia leva-me sempre a parar um pouco e a pensar nos momentos maravilhosos que vivi com eles. Penso no meu avô João. A simpatia que nutro pelo animal burro será com certeza, herança dele. Era este avô que, numa paciência sem fim, carregava o burro com dois cestos de cada lado e levava os seis netos a passear e a conhecer a aldeia. Lembro a minha avó Celeste, pequenina, de uma força inquebrável, que fazia tudo para agradar aos netos. Ainda o desejo não era manifestado e já ela o tentava conceder. Relembro a sua varanda, cheia de flores, porque o amor do avô João eram os animais mas o amor da avó Celeste eram as flores. Do lado paterno, outras duas figuras importantes na minha vida: o avô José Bernardo, dado a alguma ironia, capaz das maiores zangas, como das melhores gargalhadas. Um avô que adorava levar os netos ao café mas que ficava doente se pedíssemos uma garrafa de água (Para pedir água, vais à fonte, menina!) Guardo tanto dele na minha forma de ser! E, por fim, a última a deixar-nos, a minha avó Maria Antónia (Maria do Rosário nasceu mas era, para todos, a Maria Antónia). Serena, calma, dona de uma gargalhada quase silenciosa mas dada com gosto. Como me lembro dela, sentada à beira da lareira, dormitando ou rezando o seu terço.
Penso que tinha avós bem representativos do nosso Portugal dos anos 80. Gente da terra, ligada a ela mais que tudo. Gente que habitava as pequenas aldeias desse pequeno Portugal, que nos faziam tomar contacto com um país que mal conhecíamos. Gente rude mas capaz dos atos de maior altruísmo (Bem me lembro de ouvir o sino tocar a rebate, aquando de um incêndio, e de eles irem ajudar a combater o incêndio, bem antes de chegarem bombeiros!) Gente que tinha tempo para nos levar a conhecer as suas hortas, os seus animais, que nos ensinavam que ajudar o vizinho nas lides agrícolas era normal e expectável. Gente com tempo para mimar os netos, contar-lhes as histórias do povo em que viviam. Gente que tinha tempo para nos ensinar tudo o que nos pudesse passar pela cabeça: aprender a fazer renda; plantar uma flor; alimentar um animal. Acima de tudo, gente com tempo para gastar com os seus netos.
Hoje olho para muitos avós que conheço e penso que muito disso se perdeu, fruto, parece-me, desta tão falada crise que ora se instala, ora diz que está de saída mas que se vai mantendo por cá. Assisti a avós que, apesar de reformados, procuraram continuar a trabalhar para ajudar os filhos que não conseguem fazer face a todas as despesas mensais. Assisti a avós que, em vez de possuírem o tempo e a paz que já mereciam nesse momento da vida, se viram a braços com toda uma família instalada em casa, fruto de os filhos terem perdido a sua própria casa. Vi-os a ter que alimentar não só os filhos mas também os netos. Vi avós que trocaram os passeios com os netos no parque por um qualquer biscate que pudesse trazer mais dinheiro para casa. Vi avós que passaram a ser a “almofada financeira” a que as famílias podem recorrer, aquando de uma despesa inesperada. Vi avós a viver no stress e na angústia. Vi avós a passarem menos tempo de qualidade com os seus netos porque, tal como os pais da criança, eles não têm tempo.
Resumindo: verifico que muitos dos avós de hoje continuam a trabalhar arduamente e, tal como os filhos, não têm tempo.

É claro que os avós como os meus não desapareceram. É claro que ainda os há! E ainda bem. Mas a verdade é que tenho assistido a um aumento deste segundo modelo de avós que referi e sinto pena: por eles, que mereciam paz, e pelos netos, que mereciam ter avós como aqueles que eu tive. Isto é, avós que tinham a possibilidade de me oferecer o que de melhor há: o seu tempo para me ajudar a conhecer o mundo.

segunda-feira, 24 de julho de 2017






“Beijos, abraços e french kisses”
Tenho por hábito analisar-me nos meus comportamentos e na minha forma de ser. Procuro parar e olhar um pouco para dentro tentando perceber esse turbilhão de “coisas” que sou eu. A verdade é que antes o fazia apenas com os outros. Observava criteriosamente, ouvia com atenção e tinha tendência para analisar a pessoa que tinha à minha frente assim como os seus comportamentos. Baseado nisso, criava a minha opinião – nem sempre favorável – e dificilmente mudava de opinião daí para a frente. Felizmente, a idade foi passando e penso que me terei tornado uma pessoa mais tolerante, analisando-me mais a mim do que aos outros e aceitando, com maior facilidade as suas qualidades e, sobretudo, os seus defeitos, até porque tinha uma noção mais clara dos meus próprios defeitos.
Foi num desses momentos de autoanálise que percebi o quão complexa posso ser e o quão difícil é, por vezes, entender-me. Reparem: toda a gente que me conhece minimamente diz que sou uma pessoa que não gosta de beijos. Dizem e têm razão. Não sou muito dada a beijos. Mas, por outro lado, sou uma beijoqueira nata. Eu sou a perfeita antítese. Passo a explicar: Não gosto de beijos de circunstância. Aborrecem-me de morte. Haverá necessidade de cumprimentar com dois beijos aqueles amigos que vemos todos os dias??? Pior! Eu conheço pessoas, e tenho amigos, que se cumprimentam quando se vêm e cumprimentam-se quando se vão embora! Mesmo que, entre uma coisa e outra tenha mediado pouco mais do que uma hora! Haverá necessidade disto??? E há gente bem pior (como se isso fosse possível!)! Eu tenho familiares que te cumprimentam não com dois mas com quatro (sim, leram bem!) quatro beijos!!! É tanto virar a cara, estalar os lábios, virar a cara, estalar os lábios que quase fico com tonturas depois de cumprimentar um primo! Imaginem quando vem o casal!!! 10 minutos são usados apenas para beijos!
Convenhamos!!! Beijo é uma coisa íntima! É uma coisa para ser dada a quem nos é muito próximo!! Existirá coisa pior que acabar de conhecer uma pessoa e cravar-lhe logo dois beijos na bochecha?? Não seria bem mais simpático, e bem menos pessoal (afinal, acabámos de conhecer a pessoa!) dar-lhe um passou-bem? Sinceramente, sentir-me-ia bem mais confortável nesse papel. Facto é que, entre homens e mulheres esse comportamento até é aceite. Conhece, estende a mão, dá um vigoroso passou-bem e por aí nos ficamos, sem maiores intimidades. Já entre senhoras, esse comportamento é pouco usual. Acabou de conhecer e lá vem o beijo! E que incomodativo que ele pode ser! Há senhoras que usam uma camada tão grande de base que quando as cumprimentamos quase ficamos coladas a elas! Resistimos à tentação de esfregar a cara como fazíamos em crianças quando o beijo era mais húmido e nos deixava a bochecha molhada (berk!) E no verão? Haverá algum gosto em cumprimentar um rosto todo transpirado? Mais uma vez aquela sensação de bochecha húmida tão horrenda! Dirão, e com razão, que há muita gente que transpira das mãos. E que dar um passou-bem a uma mão transpirada também não é muito agradável. E é verdade! Mas entre a mão molhada de transpiração e a bochecha…eu escolho a mão!!! 
A juntar a isto tudo, existe ainda a forma como se dá um beijo. Já que têm que cumprimentar com um beijo, façam-no de forma simpática e sentida! Detesto aquelas pessoas que apenas estendem a cara, em total silêncio. Beijo de cumprimento obriga a um estalar dos lábios. Aquelas pessoas que se limitam a dar a cara de um lado e outro fazem-me sentir esse hábito como ainda mais desinteressante e incomodativo!
Mas…e há sempre um más…toda esta teoria cai por terra quando gosto muito das pessoas. Aí sou uma beijoqueira nata! Adoro aqueles beijinhos leves espalhados pelo corpo da pessoa amada. Adoro um beijo a sério, o famoso “french kiss” (acho o nome lindo!) que usas para explicar ao outro o quanto ele é especial para ti, o quanto gostas dele. Adoro o beijo inesperado usado para recordar à nossa companhia  que estamos ali, ainda que estejamos ocupados  a ver um filme ou a ler… Adoro o ligeiro tocar de lábios apenas porque passaste pela pessoa que amas. E aí, assumo, que nunca pensei “que horror, esta cara transpirada!”. Para quem gosto e amo não poupo nos beijos. Espalho-os, quais borboletas, leves mas cheios de sentido. Talvez seja por isso que não gosto tanto de dar beijos como um hábito social que nos incutiram. Esses beijos são, no geral, insípidos, são apenas e só um gesto formal, que nos obriga a uma intimidade que, a mim, não me apetece ter.
O beijo deveria estar na mesma categoria do abraço! Desses sim, eu gosto muito. E uso e abuso deles. Mas…com as pessoas que merecem os meus abraços: os amigos a sério; a família de quem gosto muito; a pessoa amada, claro. Um abraço tem sempre uma carga grande de sentimentos. Os nossos braços envolvem a pessoa, numa comunhão de corações e almas, embalando sentimentos. Quem não aprecia aquela sensação de abraço apertado, tão apertado que quase sentimos uma costela a deslocar? As boas energias fluem entre os dois corpos abraçados. É um momento de total entrega. Haverá algo de mais bonito? Definitivamente, sou pelo abraço!
Por norma, abraçamos aqueles que nos são muito próximos e muito queridos. Porque não fazemos o mesmo com o beijo? O beijo dado socialmente, em forma de cumprimento, não representa nada. É frio. É apenas isso: uma forma de cumprimentar. Por mim, passava bem sem ele. E elevava o beijo à categoria do abraço. Lindo mas reservado a alguns poucos… 



terça-feira, 18 de julho de 2017



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  http://p3.publico.pt/actualidade/ambiente/24113/ferdinando-o-touro-e-suas-mensagens-anti-taurinas

“Ferdinando, o Touro e as suas mensagens anti-taurinas”

Está prevista para dezembro deste ano a estreia em Portugal do filme de animação “Ferdinando, o Touro”. Estamos a falar de uma nova versão da curta-metragem de animação da Walt Disney que, por sua vez, era baseada na obra de Munro Leaf, “A História de Ferdinand”. Pela visualização do trailer que já foi lançado publicamente, parece-me que a personagem principal da curta-metragem de 1938 mantém as suas características. Ou seja: estamos perante um touro que prefere observar a paisagem, sentir o aroma das flores, à sombra de uma árvore, do que treinar para ser escolhido para as touradas. Temos presente um animal terno, meigo e muito calmo que é escolhido por engano para participar numa tourada, tendo em conta o seu enorme porte. Na versão de 1938 é anunciada a sua ferocidade e bravura mas, quando o animal entra na arena, o seu único interesse é um ramo de flores que o toureiro traz na mão. Estamos perante uma personagem que foge ao padrão atribuído à sua raça, um pacifista que se nega a ser violento. No fundo, tanto o livro, como a curta-metragem e, penso, também será o caso nesta longa-metragem que irá estrear, defendem um clima de paz e não-violência, assim como de tolerância. Diz-se que Hitler terá ordenado que a obra de Munro Leaf fosse queimada. Diz-se também que era uma das obras preferidas do pacifista Ghandi. Em Espanha chegou a ser proibida por se considerar que era uma crítica à Guerra Civil nesse país. Como qualquer grande obra de literatura, várias são as interpretações que se podem ter e será eventualmente por isso que já se ouvem algumas vozes que mencionam o facto de o filme ter informações anti-taurinas (e ainda só assistimos ao trailer!)  
No que me diz respeito (e sei que estou a pisar um ninho de vespas) parece-me muito bem que o filme tenha essas informações (se é que as tem). Esse “desporto” a que chamam tourada mais não é para mim que um espetáculo lamentável realizado às custas do sofrimento de um ser vivo para gáudio de uma audiência que rejubila perante o sofrimento do touro que nada fez para estar a ser torturado. Sei que esta é uma discussão inútil. Depressa se irão levantar as vozes argumentando sobre a nobreza e a arte da tourada (que assumo, não consigo encontrar nem perceber). Sei que irão tecer argumentos vários. O principal? A tradição milenar! Não se pode acabar com uma tradição do país. Seria perdermos um pouco da nossa identidade! No seguimento dessa ideia de manter a tradição seria normal termos ainda arenas ocupadas com gladiadores. Certo? No que a mim me diz respeito, tradições destrutivas ou que façam sofrer seres vivos não são para manter. E esse é o caso das touradas.
Gosto particularmente de um segundo argumento: o touro é muitíssimo bem tratado durante a sua vida (e não tenho dúvidas disso porque sempre que sou assaltada por alguma imagem de touradas na televisão, verifico que o touro tem um aspeto extremamente saudável). Mas…ser bem tratado em vida dá-nos o direito de lhe oferecer uma morte tão violenta? A minha gata não iria gostar de ter essa informação!
Também não suporto a ideia de que existe honra e que a tourada presta homenagem à força e ferocidade do touro…Mais uma vez são imagens que não consigo ligar: honramos, torturando? Não consigo entender…
E, por fim, o argumento mais pesado: os touros bravos são criados apenas e só com a finalidade de serem lidados. Abolindo touradas, abríamos caminho para a extinção da espécie. E a isto respondo, e perdoem-me se isto soa a alguma frieza mas…manter uma espécie apenas e só com o intuito de, mais cedo ou mais tarde, a fazer sofrer, traz algo de bom a essa espécie? Penso que não…mais uma vez não me faz sentido.
Tendo discutido várias vezes este assunto com aficionados das touradas, ouvi, mais do que uma vez a famosa “tens de presenciar o espetáculo para o entenderes”. Ao que respondo: “presenciei algo parecido e não gostei nem um pouco!” Passo a explicar: na minha época de estudante de Coimbra era tradição, na semana académica, assistir à garraiada na Figueira da Foz. E eu lá fui um ano… (inconsciência da juventude). Apesar de não apreciar nem um pouco garraiadas, pensei que a brincadeira com um vitelo não seria muito violenta para o mesmo. Qual não foi o meu espanto quando vi que estavam presentes animais de um porte considerável e que eram lidados tendo-lhes sido espetadas as famosas bandarilhas. Sinceramente…não senti a honra de que tanto falam. Senti angústia, tristeza e remorso por estar a assistir a um espetáculo onde se derramava o sangue de um animal… Para experiência bastou. Não preciso, nem quero, assistir a mais qualquer tipo de espetáculo do género.
Voltando ao “Ferdinando, o Touro”…espero que o filme continue, tal como o livro em que se baseia, a passar uma mensagem de não-violência, uma mensagem de aceitação da diferença e sim, espero que traga com ele uma mensagem anti-taurina… Espero que os espetadores saiam da sala de cinema com essas mensagens bem claras na mente.

quinta-feira, 13 de julho de 2017

http://p3.publico.pt/actualidade/sociedade/24064/da-violencia-nas-redes-sociais

“Da violência nas redes sociais”
Toda a minha vida me lembro de ser muito opinativa: para toda e qualquer situação tinha sempre um parecer a dar e tinha sempre grande vontade de partilhar esse meu parecer com o mundo. O incremento da internet e, sobretudo, o aparecimento de redes sociais como o Facebook foram, para uma faladora nata como eu, o nascer de um novo mundo. Aí tinha a possibilidade de não só dar a conhecer as minhas opiniões sobre o mundo, os seus acontecimentos e até os seus “não acontecimentos” como, e melhor que poder dar a minha opinião a qualquer hora, tinha a possibilidade de ter público a ouvir-me a qualquer hora. Assim sendo, passei a usar (não diria a abusar) as redes sociais apresentando, alternadamente, a minha satisfação por pequenos acontecimentos pessoais ou grandes acontecimentos nacionais e internacionais. Contudo, e é de facto algo estranho tendo em conta o boom de blogs a que assistimos, sempre fui expondo as minhas ideias apenas e só na minha página pessoal, de um modo breve e conciso, não me dedicando muito à escrita. Este ano, depois de muitas vezes ser incentivada a fazê-lo, e numa espécie de decisão de novo ano (posta em prática no mês de fevereiro) criei o meu próprio blog e uma página no Facebook (Steff’s World – A Soma dos Dias) onde passei a expor, por escrito, tudo aquilo que me fazia sentido: desde os fait-divers a acontecimentos importantes na vida nacional e/ ou internacional. Criados blog e página, dei o passo seguinte: convidar todos aqueles que eram amigos na página pessoal e tentar criar uma rede de leitores. Mas, cedo isso deixou de ser motivador, até porque o número de leitores era, nos inícios, bastante irrelevante.  Como tal, e algum tempo depois, comecei a enviar crónicas minhas para algumas revistas/ suplementos de jornais que sabia publicarem textos e crónicas de ilustres desconhecidos. E a verdade é que os textos foram sendo aceites, publicados, e eu adquiri o direito de ser lida por mais do que um punhado de amigos fiéis. E esta é a parte bonita e interessante desta história toda. Mas, ligada a esta possibilidade de ser lida por um público mais vasto veio algo com que nunca tinha contactado de perto e que me tem feito pensar imenso no assunto: a violência verbal que algumas pessoas usam quando estão nas redes sociais.
Pelas razões que referi tenho estado mais atenta a este “fenómeno” e tenho que revelar que estou um pouco assustada com “essa gente” que denomino de portuguesa. A título de exemplo citarei duas situações: a publicação de uma das minhas primeiras crónicas num suplemento de âmbito nacional era sobre um assunto que gerou muita controvérsia. Claramente se dividiram as hostes entre quem entendia e quem condenava. Sendo um assunto algo polémico, houve vários comentários. Quando verifiquei o número de leituras que a crónica tinha e, sobretudo, a quantidade de comentários, fiquei curiosa em lê-los. E assumo que, depois de ler, fiquei algo admirada. Admirada porque, por um lado, a grande parte das pessoas que comentaram o texto, fizeram-no porque não concordavam comigo (isso é ótimo porque, como se diz, da discussão vem a luz). Por outro lado, fiquei admirada, para não dizer espantada, com a forma agressiva como as pessoas demonstraram não concordar comigo. Relembro particularmente de uma senhora que numa frase lapidar resumiu o seu ponto de vista desta forma: “olha, outra anormal, como ele” (Sendo” ele” o sujeito de quem falava a crónica) ou de um outro senhor que me disse que só defendia o indefensável porque era paga para isso (?) Falei disso com um colega que, mais conhecedor destas lides, uma vez que costuma publicar há já algum tempo, me disse que, para bem da minha sanidade mental, não lesse muito os comentários. Percebi que é, de algum modo, habitual, o tipo de comentário agressivo e muito pouco construtivo.
Outro exemplo a que dei atenção nos últimos tempos prendeu-se com a mais recente capa da revista Cristina onde aparecem dois casais homossexuais a beijarem-se. O nível dos comentários que se podem ler sobre estas capas é assustador. A ideia de que somos um país que aceita livremente qualquer tipo de amor é, afinal, falsa. Encontramos homofóbicos escondidos atrás dos ecrãs com maior facilidade do que encontramos gatos na rua. O nível de violência é altíssimo. Desde a linguagem, utilizando as imagens mais vulgares que se possa imaginar, e que me recuso aqui a transcrever, a frases “cheias de luz” referindo que a homossexualidade é obra do demónio, acabando em frases que referem que têm pena que “essas práticas sujas não sejam condenadas”. E a agressividade não se fica por aqui! A própria Cristina acaba por ser violentada: porque traz à luz essas “sem-vergonhices” ou, veja-se, porque sabe que o assunto é sensacionalista e está a fazer dinheiro através do tema (só isso explica o facto de a senhora falar de um assunto tão pouco próprio). Todos são arrastados por uma lama de comentários absolutamente aterradores.
O que me assusta no meio disto tudo? O ser humano e a forma como atuamos. Quando estamos protegidos pela tela de um ecrã permitimo-nos mostrar o que de pior existe em nós. Não estamos preocupados com o bem parecer e dizemos (e escrevemos) tudo o que nos passa pela cabeça. Debater opiniões em redes sociais é proibido. Há que impor, da forma menos agradável e mais ofensiva, a nossa opinião, não aceitando que possam existir outros pontos de vista. Constato que, afinal, a opinião sobre a questão da homossexualidade não é tão pacífica como se poderia pensar num ano de 2017. Verifica-se que este país de brandos costumes vive com muitos preconceitos escondidos. Isto fica patente quando existe a possibilidade de dar a opinião sem dar a cara. Concluo que, afinal, somos menos pacíficos do que pensávamos; afinal somos menos liberais quanto aos direitos dos outros que supúnhamos; afinal, somos mais pela guerra do que pela paz…

 Estes são apenas dois exemplos…muitos mais poderiam ser aqui comentados. Contudo, estes dois exemplos ilustraram, com grande facilidade, a violência que se passeia no submundo que são as redes sociais. Assusta-me pensar que, ao abrigo de uma tela de ecrã, revelamos a nossa essência e que essa essência é tão feia e tão violenta.

terça-feira, 11 de julho de 2017



“Nos Alive? Recomendo!”
Nunca fui uma pessoa de multidões. OS “ajuntamentos” assustam-me um pouco. A dramática que existe em mim pensa sempre: “ e se acontecer aqui um problema? Uma bomba? Um acidente? Como é que vamos sair daqui? Eu, tão “pequena natureza” (como diria o meu pai) serei das primeiras a perecer aqui, nesta terra, rodeada de estranhos. Mas, de tempos a tempos, consigo superar esses meus temores e lá me decido a ir a um concerto ou a um festival. E a verdade é que, quando o faço raramente (ou nunca) me sinto defraudada. Foi o caso com o Nos Alive, este fim-de-semana. Desde janeiro que o bilhete para o dia 8, o “Dia Depeche Mode” estava comprado mas assumo que não estava com grande ansiedade à espera do grandioso dia. O lufa-lufa do dia-a-dia não me deixava muito espaço para pensar que no sábado estaria a caminho do Passeio Marítimo de Algés para ouvir, entre outros, os grande Depeche Mode. Contudo, sábado chegou e lá fui a caminho do festival acompanhada por um punhado de bons amigos. Era a minha estreia nos Nos Alive e, à medida que me aproximava das portas, a expetativa ia aumentando. Chegamos em horas de visitar algumas das coisas que o festival tinha para nos oferecer. Primeira paragem: Fado café, uma salinha, adornada de fotos de muitos dos nossos artistas e fadistas, bem catita. Não tivemos a sorte de chegar a tempo de ver alguém em palco mas a nossa estadia por lá foi acompanhada pela voz da Amália, interpretando “Gaivota” o que nos fez relembrar o porquê da Amália ainda hoje ser a Amália (aquela voz continua insuperável!)
Fomos passeando aqui e ali, aproveitando algumas ofertas, nomeadamente, pinturas faciais, enquanto aguardávamos pelo início dos concertos que eram a nossa verdadeira razão de ali estar. Os primeiros a subir ao palco foram os Black Mamba. Não sou grande conhecedora da obra deles mas o que vi foi, quanto a mim, ótimo. Boa presença em palco, uma voz muito interessante, os coros femininos a acompanharem magistralmente a voz principal, sons que misturam rock com blues…sim senhora, um bom início, o público ainda não era muito e eu não me sentia claustrofóbica. Seguiram-se os Kodaline. Não poderei julgar muito do que vi porque, assumo, aproveitei esse espaço para ir “jantar” uma bifanazita que trazia de bónus um croquete! Vi o final do concerto e a ideia que me ficou é que se trata de uma banda “fofinha” com uns temas orelhudos. Não quero com isto dizer que são maus. Pelo contrário. Acho que falta ainda alguma presença em palco mas são simpáticos. Seguiu-se uma das atuações da noite. Assumo que tinha expetativas em relação aos Imagine Dragons. Mas o que vi foi completamente avassalador! Um início com um discurso antiterrorista, relembrando que o medo não vencerá, uma energia fulgurante em palco, uma voz sem falhas a que se junta o ser um percussionista de enorme qualidade, uma vontade de estar com o público enorme. Uma hora de puro entretenimento enquanto se aguardava pelos cabeças de cartaz, Depeche Mode. E chegaram! Com dois minutos de atraso (Uma das coisas que apreciei neste festival foi o cumprimento rigoroso de horários!) Contrariamente a muito do que se ouve, eu gostei imenso. Foram iguais a si próprios. Dave Gahan continua com a voz que se lhe conhece que faz questão de acompanhar com os seus movimentos de dança muito próprios. Penso que o público esperava que apenas se cantassem velhos sucessos. Não foi o caso. Cantou-se um pouco do novo álbum e alguns (não todos) dos velhos êxitos. Sim, aqui e ali, houve momentos menos conseguidos mas, no geral, não defraudaram as minhas expetativas e gostei do que vi e ouvi. Não escolheram a fórmula fácil de apenas revisitar as velhas glórias, e isso agradou-me. Não vivem do passado, mostraram que ainda são os velhinhos Depeche Mode mas que ainda são presente e não só passado. Claro que o final foi em apoteose com um maravilhoso “Personal Jesus” em que todos gritavam a plenos pulmões “Reach out and touch faith”!!  
Quanto ao resto? Nada a criticar. Parece-me que os portugueses se estão a tornar pessoas civilizadas e portanto o lixo não se acumulava, em montanhas vergonhosas, nos cantos. Procurava-se contentores para largar copos e garrafas. Grandes melhorias nos comportamentos de cidadania!!… As casas de banho eram muitas, não dando lugar àquelas filas medonhas em que perdes 45m minutos de um concerto apenas porque a natureza chamou! Para além disso as casas de banho tinham água canalizada (a prova que Deus existe!) Uma “praça da alimentação” de dimensões consideráveis, onde existiam algumas opções de escolha. Espaços vários que não tive tempo de percorrer (outros palcos, o palco da comédia…) que me pareceram igualmente interessantes! E, acima de tudo, apesar da multidão, apesar de estar esgotado, a sensação que há espaço para muitos mais! E para uma claustrofóbica como eu isso é essencial!
Sem dúvida um festival que merece esgotar como esgotou. Como acabou a noite? De um modo maravilhoso que não é permitido a todos: túnel fechado, caminhada de 20 minutos pelas IC17 (Um privilégio) até chegar àquele ponto que, estando o túnel aberto terias percorrido em 3 minutos. Mas considerei isso uma particularidade do Festival que me fez soltar umas gargalhadas e queimar umas calorias!
Se aconselho? Sim! Se voltarei ao N.Alive? De certeza que sim! Se acho que valeu a pena deslocar-me desde o Alentejo? Não tenho a menor dúvida! Que venham mais, com esta qualidade e organização!

quinta-feira, 6 de julho de 2017

“Os sistemas de castas nas escolas”
Penso que todos aqueles me vão acompanhando por aqui, pela minha “Steff’s World – A Soma dos Dias” saberão que sou uma professora contratada. E sim, é esse o meu título: Professora contratada! Não apenas professora. A denominação “professora” é demasiado vasta. Abarca professores de várias idades, de várias condições. Por isso, tivemos que arranjar formas de especificar de que professores estávamos a falar, criando estes subtítulos: professor contratado, professor de QZP (Quadro de Zona Pedagógica), professor de quadro (de determinada escola). No fim de toda esta linhagem poderia ainda citar o professor estagiário, que se encontra bem no fundinho desta hierarquia.
Como professora contratada (poderia dizer há quantos anos mas isso levaria o caro leitor a fazer contas, tentando adivinhar a minha idade…e simplesmente, isso não me apetece…) tenho conhecido imensas escolas. Umas mais acolhedoras, outras menos mas, a verdade é que em todas podemos encontrar com facilidade a estratificação dos professores. Essa estratificação é bem clara a vários níveis e facilmente reconhecível nas salas dos professores. Diria, de um modo um nadinha exagerado e necessariamente irónico, que nas escolas nos encontramos perante um verdadeiro sistema de castas. Uma verdadeira divisão social que coloca cada um no seu lugar, não permitindo (sob pena de ser apontado a dedo) a transferência de uma casta para a outra. Analisemos então essas diferentes classes:
Comecemos pela casta mais alta, a dos “Brâmanes” que é constituída, obviamente, pelos professores de quadro de escola, aqueles bem antigos. São aqueles ilustres professores que são muitas vezes intitulados pelos alunos, de um modo carinhoso como o/a velho(a). São esses que fazem parte de uma escola que se regia por outras regras. Aqueles ilustres que se permitiam tirar férias para “ir à neve”. Professores que percebem a escola como parte da sua casa e por isso consideram que podem mandar e “desmandar” nela. E portanto, são aqueles professores que têm a sua própria mesa, na sala dos professores, à qual não te podes sentar, a menos que sejas convidado. São aqueles colegas que passam o ano a ignorar-te porque têm o seu próprio grupo de amigos constituído. Professores que te tratam por colega por ser mais fácil do que tentar decorar o nome de mais um colega que, “assim com’assim” irá embora no final do ano. Verdadeiros dinossauros, fazem um pouco como lhes apetece. Não querem cargos nem nada que dê muito trabalho para além de dar as aulas. Por vezes gostam de mostrar alguma dificuldade em atualizar-se por ser mais fácil, deste modo, escusar-se a fazer tarefas. Os brâmanes estão na posição mais elevada, são a casta mais alta. Por isso, é aquela que se encontra mais próxima dos deuses. Nesta minha metáfora obviamente que os deuses serão os elementos da direção. E porque estão mais próximo, e porque estes senhores têm mais vida para além da profissão, as direções acabam por lhes tentar atribuir turmas pouco problemáticas, cargos pacíficos, para que continuem a levar o seu trabalhinho de forma ligeira, como se a sua profissão fosse um pormenor nas suas vidas ocupadas.
Descendo um pouquinho na hierarquia social das escolas, encontramos os Xátrias. Na minha imagem metafórica, são os Quadros de Zona Pedagógica. São aqueles que militam pela causa da escola. Não são os doutos habitantes da escola desde os ano 80. Mas já têm uma outra posição. Correndo bem, passam 4 anos em cada estabelecimento. Levam algum tempo a adaptar-se. Mas, quando se adaptam, são a força trabalhadora. No final de um ano já conhecem a escola e, por isso, são eles que ocupam os cargos com alguma carga de trabalho. São os diretores de turma, os coordenadores dos vários projetos. Começam a sentir a escola como deles e tentam melhorar os resultados. Acreditam ainda na causa da educação. Estes têm a mesa ao lado dos dinossauros e vão sendo reconhecidos pelos Brâmanes. Por isso, e quando necessário, fazem a ponte entre os Brâmanes e a casta que se segue aos Xátrias que é a dos Vaixás.
Os Vaixás são os professores contratados. Os que se encontram quase no fundo da hierarquia. Aqueles a quem muitas vezes não é digno sequer dirigir palavra. Estes são “o colega” que poderá ser útil em determinada altura pelos seus conhecimentos de informática (normalmente bem mais abrangentes que os das castas anteriores). Por isso há por vezes uma certa simpatia condescendente para com o contratado e o dinossauro dirige-lhe a palavra: Ah, vocês, “jovens” têm uma vida complicada!! Eu não saía de casa, não vinha para tão longe para receber estes trocos! E a isto se resumirá a interação entre uns e outros Estes contratados terão uma mesa só deles, não havendo misturas com as castas anteriores, se a dimensão da sala o permitir. Se a sala for pequena, terá uma de duas hipóteses. Aproveitar o “intervalo grande” para fumar fora da escola…ou puxar por uma cadeira para tentar se integrar, assim como quem nada quer…
No fundo da hierarquia encontramos os “Sudras”. Esses são o professor contratado mas que ainda é muito novo, terá feito estágio num ano anterior, ou aquele que vem substituir um colega por um mês. Sobre este caem todas as suspeitas: não tem mão para estes alunos! Será que tem experiência? Saberá do que vem falar?! E esse desgraçado, provavelmente, entrará e sairá da escola sem que tenham reparado que ali esteve um colega a trabalhar por um ou dois meses.

Isto é o que se passa numa escola dita “normal” e de grandes medidas. Nada do que se passa em Avis aqui no meu canto. Os “deuses” aqui não são deuses. Estamos perante uma direção que desde o primeiro momento em que cheguei, até ao último, se mostrou próxima de todas as castas. Uma direção que desde o primeiro momento decorou o meu nome e me tratou como uma colega da escola. Um cantinho onde não existe a mesa dos dinossauros. Existe a mesa onde se toma café e onde não se fala em trabalho. A mesa onde quem falar em trabalho paga uma multa. Uma mesa onde se decidiu que, durante um intervalo, há que esquecer que somos professores e falar e rir sobre tudo e nada. Uma casa onde os dinossauros não são dinossauros e lidam com os colegas de qualquer casta. Assim eles se queiram integrar. Sou contratada e vinha para uma substituição. Nunca fui tratada como aquela que pertence a uma casta inferior. Escolhi fazer parte e senti que fiz parte. Senti-me bem. Disseram, em tempos, que sou especial. Talvez tenha sido. A escola também o foi. Talvez o pensamento não seja o mesmo para todos…tenho certeza disso. Mas esse é o meu testemunho. O testemunho de uma Sudra que se sentiu que fez parte de uma escola onde as castas foram abolidas.

segunda-feira, 3 de julho de 2017


Texto publicado no P3 - http://p3.publico.pt/cultura/exposicoes/23996/quotviva-la-vidaquot-celebrando-frida 

“Viva la Vida[1] – Celebrando Frida”

Há 110 anos nascia, no dia 6 de julho, Magdalena Carmen Frida Kahlo y Calderón. A pintora mexicana mundialmente conhecida por Frida Kahlo. Para além de passarem 110 anos do seu nascimento, sabe-se que a mesma faleceu muito jovem, com apenas 47 anos. Como tal, sobre a sua morte passam já 63 anos. Ainda assim, e neste julho de 2017, pergunto: “haverá alguém que não conheça Frida Kahlo e a sua imagem?” Tenho as minhas dúvidas!
 Seria pertinente perceber por que razão será Frida, ainda hoje, um ícone tão conhecido e tão comentado. É claro que estamos a falar de uma artista, uma pintora fantástica de reconhecido talento. Só este facto serviria, por si só, de resposta à minha questão. Contudo, penso que o conhecimento e o interesse por Frida Kahlo vão muito para além da artista que se escolheu a si própria como tema principal dos seus quadros, vão muito para além desta denominada surrealista (surrealismo que ela não reconhecia na sua obra). Frida será ainda hoje conhecida pela sua arte, mas também pela sua imagem, pela forma intempestiva com que viveu a sua vida, pela sua paixão, pela sua própria imagem tão marcada como marcante, pelo espírito livre que demonstrou ser. Vejamos alguns factos que a tornaram, quanto a mim, um ícone mexicano reconhecido mundialmente.
·         A sua forma de vestir: desde muito nova que Frida demonstrou ter vontade de desconstruir conceitos e ultrapassar barreiras culturais. Quebrou vários tabus na sua época. Apresentava-se, nas suas vestimentas, da forma que mais lhe agradava, pouco se preocupando com as modas ou com convencionalismos. São conhecidas as fotografias de Frida vestida como um dandy bem-apessoado, aquando da sua adolescência. Acredito que a sociedade mexicana ficaria bem chocada com esta jovem vestida de homem, de sobrancelha grossa e bigode. Mais tarde, diz-se que pelas fragilidades físicas apresentadas pelo seu corpo (uma perna mais magra que a outra e mais curta, fruto da poliomielite e de um acidente de viação), começou a usar roupas que as disfarçassem, nomeadamente, as saias compridas e garridas, típicas da cultura mexicana. A isso associou os acessórios coloridos, as flores e fitas nos seus penteados, frequentemente de tranças feitos. Incorporou, tanto na sua arte como na sua forma de vestir, símbolos indígenas e mexicanos. E foi esta a imagem que ela apresentou nos EUA quando lá viveu ou em qualquer país europeu que tenha visitado, tão fora do que era considerado “a norma” na época. E é esta, sem dúvida, a imagem que ainda hoje é recordada.
·         A sua forma de amar: Frida apresentou ao mundo, sem complexos, a sua bissexualidade. Apesar do amor, diria, doentio pelo seu marido (o também pintor, Diego Rivera) ficaram largamente conhecidos os seus romances, fogosos, tanto com homens como com mulheres.
·         A sua personalidade e o seu modo de estar: pelo que conhecemos de Frida, percebemos que se tratava de uma personalidade forte, denotando-se essa personalidade na forma como se vestia, na intensidade com que procurou viver, apesar de todos os dissabores que foi sofrendo ao longo da vida, na forma como sempre lutou pelos direitos e pela afirmação da mulher. Era uma mulher que teria todas as razões para vestir a sua vida de luto mas que escolheu vesti-la de cores e de flores. A sua grande fragilidade seria o amor que alimentava por Diego, amor salpicado por traições mútuas que a iam enfraquecendo e destruindo a sua autoestima. Terá dito que teve dois grandes acidentes na vida: o do autocarro onde ficou gravemente ferida e conhecer Diego Rivera. Esse segundo seria o pior acidente, nas suas palavras.
·         A resiliência com que encarou a dor e o sofrimento: o sofrimento físico esteve sempre muito aliado ao sofrimento emocional. Contudo ela escolheu transformar esse sofrimento na festa de cores que se lhe conhece, em algo de positivo. É-lhe atribuída a autoria de uma frase que sintetiza bem esta ideia: “A arte mais poderosa da vida é fazer da dor um talismã que cura; uma borboleta renasce florida numa festa de cores!” Essa força e essa resiliência ficam bem patentes naquela que será a sentença mais conhecida da pintora “pés para que os quero se tenho asas para voar?” (Relembre-se que muitas vezes Frida Kahlo teve, ao longo da sua vida, de se deslocar em cadeira de rodas e que chegou a ser-lhe amputada uma perna).
 Contudo, e apesar de todas estas características positivas, F. Kahlo levou uma vida de altos e baixos. Alternava períodos de grande sociabilidade com períodos mais depressivos que culminavam, muitas vezes, em tentativas de suicídio. As últimas palavras que se encontram no seu diário são que espera partir e não voltar a este mundo: “espero alegre a minha partida e espero não retornar nunca mais”. Diz-se que terá morrido de embolia pulmonar…aos 47 anos. Outros dizem que terá sido mais uma tentativa de suicídio (bem sucedida, desta feita).
O certo é que Frida nasceu há 110 anos. Foi sem dúvida uma mulher à frente no seu tempo. Provavelmente sê-lo-ia ainda hoje. Lutou pelos direitos das mulheres e mostrou ser um exemplo singular de inteligência e caráter. Viveu intensamente. Rompeu com padrões morais e estéticos da época. Foi, acima de tudo uma mulher apaixonada mas independente e forte que viveu de acordo com os seus próprios princípios. A sua imagem representa, ainda hoje, a liberdade de ser única. E por ser única, fez a capa da Vogue em 2012, 58 anos depois da sua morte…



[1] Inspirado no quadro de Frida Kahlo “Viva la vida Sandías”