domingo, 29 de outubro de 2017


E já chegou o horário de inverno…
E esta noite (noite de sábado para domingo) dormi mais uma hora que o habitual. Quer isto dizer que quando olhei para o relógio, ainda com o cérebro entorpecido pelo sono e os olhos remelosos (Sim, porque ninguém acorda com o ar fresco de quem acabou de sair do banho) vi que ele, o relógio, assinalava 9 horas. E pensei…que maravilha! É domingo! Posso dormir mais uma horinha!! Contudo, o segundo pensamento foi: Afinal são 8 horas! Posso dormir mais duas horas!! Hoje é o primeiro dia do horário de inverno. Dito isto poderia pensar-se que gosto deste horário de inverno. Nada mais errado! Esse malnascido horário de inverno apenas tem um aspeto positivo (que bem vistas as coisas nem é assim nada de mais!): oferecer-me uma hora de sono extra, uma única noite no ano, num dia em que a mim nem me traz grandes benefícios (Não tenho o hábito (ou a necessidade) de levantar muito cedo ao domingo…)
Mas a verdade é que todos os anos eu tenho de passar por esta alteração horária. Todos os anos acalento, secretamente, a esperança que seja este o ano em que se decidirá pelo não à mudança para o horário de inverno mas, invariavelmente, todos os anos, vejo a minha esperança defraudada e a hora mudar: “Quando forem duas…atrase para a uma”. E eis que está dado o passo para que comecem os dias cinzentos, os dias frios, os dias pequeníssimos.
Procurando encontrar uma forma de gostar desta mudança horária, fui tentar perceber quais eram as razões inerentes a essa mudança de hora. Talvez a mudança tivesse uma explicação simpática. E ao que parece, tudo começou com uma ideia peregrina de Benjamin Franklin em 1784… Na altura a ideia surgiu com o intuito de poupar velas. Ainda assim, e pelo que fui lendo por aí, esta ideia apenas voltaria a surgir e seria aplicada em 1916, com o intuito, desta feita, de poupar carvão. A ideia era que não se desperdiçassem horas de luz durante as manhãs. As pessoas acabariam por levantar mais cedo, aproveitando, assim, melhor o dia. Com o início da Iª Guerra Mundial países como a Alemanha e a Grã-Bretanha adotaram este “Daylight saving time” (como ficou conhecido) a fim de se poder poupar e economizar tendo em conta o transtorno da guerra. Terminada a guerra, houve quem abandonasse a alteração de horário. O Daylight saving time foi retomado por várias nações, em 1939, demonstrando que um mal (2ª Guerra Mundial) nunca vem só… Mais uma vez, ao terminar a guerra, houve países que foram abandonando as mudanças de hora no horário de inverno e no horário de verão. E, pelo que fui lendo, andou-se assim um pouco ao sabor das ondas, até aos anos 70, data em que o Daylight Saving Time foi uniformizado tendo em conta as preocupações, mais uma vez económicas, que surgiram decorrentes dos obstáculos que os países árabes começaram a colocar na aquisição do precioso “ouro negro”. Pelo que entendi, a ideia foi sempre a de poupar… e não de fazer as pessoas mais felizes… No que aos países da União Europeia diz respeito, esta “tradição” mantém-se, até aos dias de hoje, devido a uma diretiva datada de 1981, que determina que os seus estados-membros devem entrar na hora de inverno no último domingo de outubro e na hora de verão no último domingo de março. E assim, de seis em seis meses, acontece-nos uma noite com mais uma hora (horário de inverno) e uma noite com menos uma hora (horário de verão). E, apesar de já ter passado por isto desde que me conheço por pessoa, ainda não me consegui habituar e muito menos consegui gostar desta mudança horária, sobretudo quando a mudança se faz para o horário de inverno.
Dou por mim a pensar: será que isto ainda faz sentido? Não poderíamos ficar eternamente na hora de verão? Será que este horário ajuda a poupar o que quer que seja? Tenho as minhas dúvidas, nos tempos que correm. O que sei é que a hora de verão é bem mais simpática! Ok, se a mantivéssemos levantávamos às 8 horas da manhã e poderia estar ainda um pouco escuro. Mas… “assim como assim”, é suposto os dias de inverno serem escuros e cinzentos. Não me incomodaria muito, penso eu, levantar e ainda ver estrelas no céu…rapidamente o sol iria levantar e o dia acordar! Agora o que consegue tirar-me do sério é ver que daqui mais uns dias serão 17 horas e já estará praticamente de noite! Os dias são minúsculos. As noites são intermináveis. Quem pode ter vontade de praticar desporto depois de estar escuro com breu? Quem pode ter vontade de passear, de fazer turismo? Basta um almoço um pouco mais prolongado para se perder a tarde toda e impossibilitar qualquer tipo de visita que tenha de se realizar na rua, sob a luz do sol. Parece-me que este horário demoníaco apenas se mantém para obrigar as pessoas a estar em casa. As horas de sol, efetivas, são muito poucas para mim. No horário de verão, terminamos o trabalho e temos tempo para apreciar o resto do dia, passear, ler um livro numa varanda, beber algo numa esplanada, ou até mesmo realizar as tarefas caseiras, aproveitando os bons pares de horas que ainda temos pela frente com luz solar. Tal é impossível no horário de inverno. O inverno é cinzento, escuro e frio. Este horário só ajuda a torná-lo ainda mais feio, ainda menos suportável. Não tenho base científica para o que vou dizer, mas acredito que as depressões sejam em maior número neste horário. Abomino esta mudança! Para mim é a verdadeira machadada no verão que já nos abandonou.
Se bem me lembro houve uns anos em que a mudança de horário não se verificou. Se a memória não me atraiçoa, lembro que no pico do verão eram quase 22 horas quando se dava o anoitecer. Isso agradava-me… e vivo na esperança que o mesmo volte a suceder.

Estamos em outubro, 2017. Ainda não foi este ano que cortamos relações com o horário de inverno. Hoje dormi mais uma hora…e hoje irei verificar que às 18 já não existirá sol…e durante os próximos 6 meses estaremos sob o domínio deste horário que nos obriga a conviver com a noite escura muitas mais horas do que aquelas que eu quereria e gostaria… Como disse, não gosto deste horário. Apresento o meu veemente NÃO! a esta alteração. E vivo na esperança que um dia se acabe com esta imposição do horário de inverno/ horário de verão. Terei, com toda a certeza, um nível ligeiramente mais elevado de felicidade!

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

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Reivindico o meu direito de estar infeliz!
Sim, leram bem e não existe qualquer tipo de erro no título. Hoje não venho reivindicar o meu direito de ser feliz (que também tenho, é claro) mas sim o direito de estar infeliz. Tenho pensado ultimamente sobre esta questão até porque, sem nenhuma razão em especial, ou, eventualmente, por todas as razões possíveis, tenho-me sentido mais vezes melancólica. Não é uma tristeza a cem por cento, daquelas que nos fazem chorar o dia todo, nos fazem apreciar o facto de passar o dia todo em pijama a “sofazar”, a fim de nos sentirmos miseráveis, e nos fazem comer todo o tipo de porcarias. Não, nada disso. Apenas me sinto com uma sensibilidade mais à flor da pele, uma impaciência a um nível maior do que é habitual, uma menor tolerância para com as situações e as pessoas, um modo menos expansivo de ser e estar …no fundo, aquilo que os ingleses sintetizam com um magistral feeling blue. E a verdade é que acho que tenho o direito de me sentir assim “menos bem”. E foi por causa deste meu “estar” e do diálogo com alguns amigos sobre este assunto que comecei a ponderar sobre este direito de ser/ estar infeliz e cheguei à conclusão que existe, à nossa volta, uma certa intolerância para com os menos felizes e, como tal, uma certa pressão para que as pessoas estejam sempre felizes.
Quando passamos por uma situação mais negativa é-nos permitido, pelas pessoas que nos rodeiam, termos o nosso momento de tristeza. É um facto. Mas, por pior que seja a situação – a pior – a morte de um ente querido –  ou outras situações menos agradáveis – uma situação de desemprego, o fim de uma relação, uma doença – o certo é que o momento de tristeza não se pode estender por um período de tempo muito alargado sob pena de as pessoas se começarem a afastar de ti. Não sabemos lidar com a dor, com a tristeza e com o sofrimento. Não queremos pessoas negativas. Pessoas que veem o lado mais negro da vida não são boa companhia! Como já referi, existe uma certa pressão da sociedade para nos mostrarmos sempre felizes. Essa pressão verifica-se na janela que todos (ou quase todos) temos aberta para o mundo: as redes sociais. Sim, poderá haver um dia em que iremos criar um post indicando que naquele dia não nos sentimos a 100%. Mas, no geral, o que iremos colocar naquela janela aberta para o mundo? Os momentos de felicidade, os momentos de festa, os momentos de alegria. (Ainda que muitas vezes esses momentos sejam, muitas vezes, apenas fictícios). Mostramos que somos fortes, que somos resilientes, que superamos as dificuldades. Sabemos que é isso que os outros querem ver. Sabemos que eles querem espreitar por cima do ombro, espreitar o mundo alheio e acreditar que ali não mora qualquer tipo de tristeza, mal-estar ou dor. Todos somos felizes neste mundo de faz de conta. E, quando pensamos no quão falsa é aquela vida retratada de um modo sempre tão feliz, defendemo-nos afirmando para nós mesmos: “não me quero expor”. E essa pouca vontade de exposição até faria sentido se não passássemos a vida a expor um lado da nossa vida – o luminoso –, guardando o lado mais sombrio (que sempre existe) para nós próprios.  
E hoje quero mostrar o meu total desacordo com esta situação. Quero ter o direito de estar triste. Quero ter o direito de chorar apenas e só porque me sinto triste nesse dia. E, como mulher que sou, nem preciso de razões muito grandes para ter vontade de chorar. Quero ter o direito de ter os meus momentos mais depressivos. Quero ter o direito de quebrar, de cair e, se necessário for, de me estatelar no chão. E quero ter o direito de lá ficar até que sinta forças para me levantar. Quero ter o direito de estar ali deitada até que sinta que a dor que se tornou suportável. Quero ter o direito de poder falar dessa tristeza, o direito de a partilhar como partilho os bons momentos. E, acima de tudo, quero ter o direito de poder contar com as pessoas que amo nesses momentos em que, provavelmente, menos o merecerei. Quero poder contar com eles até ter forças para superar esse estado de maior tristeza.
Temos que perceber que não existe a noção de felicidade se não existir a noção de infelicidade. Como poderia eu saber o que é ser feliz se não tivesse já vivido momentos de profunda infelicidade? Uma é o contraponto da outra. Uma não pode existir sem a outra. E, como tal, temos que perceber que esta caminhada que fazemos pela vida estará sempre recheada de momentos bons e momentos menos bons. Apenas temos que os aceitar sabendo que os bons não duram para sempre tal como os maus têm sempre um fim. Sabedoria popular e que tão bem define esta questão que é viver.

Sou uma pessoa feliz por natureza. De bem com a vida. Aceito o que ela me traz, normalmente, sem grandes dramas. Mas tenho os meus dias, os meus momentos, que se podem prolongar ou não, de maior tristeza. Momentos em que me sinto mais cabisbaixa, menos esperançosa com o mundo, mais melancólica. Existem dias cinzentos. Por vezes prolongam-se por várias semanas. Contudo, sabemos que cedo ou tarde, o sol, com a sua luz, virá. O mesmo se passa com os estados menos felizes. Por isso, exijo o direito de estar triste. Exijo poder sentir-me assim sem me sentir culpada por não estar feliz. Há que reconhecer que temos esse direito, reconhecer que precisamos da tristeza, da angústia, da desilusão, do desengano para percebermos os sentimentos de alegria, encanto, ilusão e felicidade. Seremos, com certeza, seres humanos mais equilibrados quando nos oferecermos o luxo de, por vezes, estar triste. Por isso volto a dizer que reivindico o meu direito de estar triste, pouco feliz, e não deixo que ninguém me o queira roubar.

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Sou uma fã da fotografia. Sou aquela pessoa que adora capturar o momento para a eternidade, registá-lo na ótica para mais tarde poder voltar a ele, relembrá-lo e saboreá-lo com a intensidade com que foi vivido. Como tal, desde sempre me lembro de possuir uma câmara fotográfica na mão. Desde uma maravilhosa Canon, na qual colocava o rolo, quando as situações eram tão importantes que sentia que teria que registar, pelo menos, 36 momentos inesquecíveis, até aos primeiros momentos da fotografia em formato digital.
Até há muito pouco tempo, fazia parte da minha «trouxa» diária a máquina fotográfica Sony Cyber-shot (tendo tido vários modelos da mesma máquina ao longo dos anos). Aí, não tendo a limitação dos números, passei a fotografar um pouco de tudo: os amigos, a família, os encontros, os reencontros, as festas, os tudo e os nada do dia a dia. Passei a fotografar, também, animais: gatos, pássaros, todo e qualquer animal que encontrasse em posições ou situações divertidas ou caricatas. Passaram a fazer parte do meu espólio fotográfico paredes pintadas com frases que me inspiravam, encontradas por esse país fora, obras magníficas de street art e, em menor número, paisagens citadinas e campestres. Tudo e todos eram razão para fotografar. E, a partir do momento em que os telemóveis passaram a incorporar uma câmara fotográfica com maior qualidade e uma maior capacidade de armazenamento, posso dizer que este comportamento se agravou. É raro o dia em que não encontre 4 ou 5 razões para fotografar. Isto sem falar nos dias festivos, nos dias com amigos e/ou família, em que o número de fotografias sobe para o nível das centenas! E guardo todas: desde aquelas em que parecemos verdadeiras modelos àquelas que denomino de «tesourinhos deprimentes». Sou a fiel depositária de todas essas fotos do meu grupo de amigos.
Mas desenganem-se aqueles que poderão já estar a pensar que sou uma excelente fotógrafa! Apenas gosto de capturar momentos e cenários de felicidade, momentos caricatos e divertidos. Como dizia Henri Cartier-Bresson: «Fotografar é colocar na mesma linha a cabeça, o olho e o coração.» Fotografo para guardar para mim a imagem vista, pensada e apreciada naquele momento.
Contudo, percebi em duas ou três situações que o contrário aconteceu. Percebi que, sempre que os momentos foram totalmente arrebatadores e inesquecíveis, acabei por nem me lembrar de fotografar ou, se o fiz, foram poucas vezes. Assim aconteceu naquele concerto inolvidável dos u2 em Coimbra, em que raras foram as fotografias que tirei, e assim acontece com o meu amado Alentejo. As viagens de e para o Alentejo têm-me presenteado com paisagens magníficas, dignas de postal. Contudo, conto pelos dedos das mãos as fotos que tenho dessas paisagens admiradas. Assim aconteceu, também, com uma das paixões da minha vida. Apesar dos muitos e bons momentos, raramente aflorou à minha mente aprisionar aqueles momentos para a eternidade.
Todavia, ainda que sem fotografias, consigo relembrar sem dificuldade a voz do Bono Vox, consigo recordar a emoção que senti durante todo aquele concerto, consigo lembrar de todo o ambiente que se sentia naquela noite chuvosa. Quanto ao Alentejo, basta pensar nele para se formar na minha mente as magníficas paisagens a que assisto na primavera com os seus tons de verde, amarelo e roxo ou, no verão, com os seus vários tons de amarelo. Basta pensar nestas viagens para sentir o cheiro que tão bem caracteriza o «meu» Alentejo e para sentir no meu peito aquele estado de encantamento que só o Alentejo me oferece.
Quanto a ti, paixão perdida num passado que já se vai fazendo velho, percebi que nunca precisei de uma fotografia para relembrar o teu sorriso. Tornaste-te, ou tornei-te, eterno no momento em que percebi que contigo a vida era mais colorida, mais leve e mais bonita de viver. Poderia, sem dificuldade, e se a tanto me chegasse a arte, desenhar cada linha do teu rosto, cada linha do teu corpo. Nenhuma fotografia poderia manter-te mais vivo na minha memória do que as recordações que tenho. Ainda assim, se apenas me fosse permitido manter uma memória tua, se tivesse de te eternizar em apenas um pormenor, esse pormenor seria esse teu sorriso. O sorriso que, apesar das vicissitudes da vida, sempre se foi mantendo e que, talvez por isso, ficou gravado na minha alma.
Sou uma amante da fotografia. Através dela capturo e penso guardar para a eternidade todos os bons momentos, as pessoas interessantes que atravessaram a minha vida, os pormenores curiosos ou até divertidos. Mas percebi que existem coisas magníficas – um concerto, uma paisagem, um sorriso – que, por serem tão excepcionais, se eternizaram na minha mente sem qualquer possibilidade de, um dia, serem apagados. E é na mente e no coração que os quero guardar como pequenas preciosidades, pequenos tesouros que não quero partilhar com mais ninguém.

terça-feira, 17 de outubro de 2017


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Aqui há tempos, após a vitória do Salvador Sobral no Festival da Eurovisão, escrevi uma crónica que intitulei de “O 5º Império”. Ainda inchada de orgulho por, finalmente, termos ganho um festival no qual, a maior parte das vezes, saímos humilhados, dei por mim a pensar que Portugal estava, de facto, a viver um momento bastante positivo. Relembro que escrevi a crónica com o pensamento em Fernando Pessoa e na sua ideia de que Portugal poderia ser o tal 5º império por ele idealizado. Pessoa imaginava um 5º império que iria resgatar o país da decadência em que se encontrava, transformando-o numa potência que reinaria sobre as outras. Mas esta potência não reinaria sobre as outras em termos políticos e económicos mas seria um império de fraternidade universal, cultura e língua portuguesas. E, naquele momento, esta apologia do 5º império fez-me sentido. Finalmente começava a ser reconhecida a nossa qualidade. A seleção portuguesa em que poucos acreditavam, aquela que muitos vaticinavam regressar a Portugal ainda na fase de grupos, sagrava-se campeã europeia. A nossa figura de proa, Cristiano Ronaldo, era nomeada “o melhor do mundo”. A nível da literatura, relembrava que o nome de Portugal tinha ficado no mapa aquando da entrega do prémio Nobel da Literatura a José Saramago. Pensava que este poderia ser, finalmente, o ano do reconhecimento da Academia do eterno candidato, António Lobo Antunes (verificou-se, afinal, que ainda não foi este ano). Vencíamos “sem espinhas” um festival cujo primeiro lugar sempre nos tinha escapado. O produto português era considerado por muitos (e é de facto) como um produto de qualidade, fosse ele na área do calçado, do vestuário, dos móveis ou em tantas outras áreas em que o país se distingue pela qualidade que oferece.
A acrescentar a esta minha ideia, verificava-se que Portugal estava a atravessar uma fase muito positiva a nível turístico. Lisboa era apresentada como uma das cidades europeias mais bonitas e uma das mais seguras. As nossas praias há já algum tempo que eram reconhecidas pela sua qualidade e beleza. O país, de uma forma geral, era reconhecido pelo seu bom clima, boa comida e a simpatia das suas gentes. E, como cereja no topo do bolo e mais uma vez a corroborar esta minha ideia que Portugal está na moda, eis que Portugal vence pela primeira vez os “Óscares do Turismo”, os World Travel Awards, como sendo o melhor destino europeu. Na linha deste pensamento relembraria, ainda, as várias figuras famosas que escolheram Portugal para por cá viver. Destacaria, entre as várias figuras, a Madonna que, apesar de nos últimos tempos não parecer tão encantada com o país como se apresentava nas primeiras estadias por cá, tem feito uma enorme publicidade ao país e às suas maravilhas.
Perante todas os factos acima identificados, assumo que o meu pensamento era que Portugal estava de facto na moda e que a profecia de Pessoa se estava, finalmente, a concretizar.
A primeira facada neste meu pensamento encantado sobre Portugal e o 5º Império deu-se com a tragédia de Pedrógão.  Como era possível num país como o nosso, parte integrante da Europa, minimamente desenvolvido, conhecido pela sua beleza, acontecer uma tragédia destas? Era inimaginável “acontecer Pedrógão”. Mas aconteceu! E para nos sentirmos mais calmos perante essa calamidade, ouvimos que a tragédia tinha acontecido perante situações muito especiais. O calor, um raio, o mau ordenamento do território, falhas no sistema de comunicação. Quiseram dar-nos a entender, quiseram fazer-nos acreditar que Pedrógão era um caso excecional, que as 64 (?) vítimas tinham sido fruto de um somar de situações que não mais voltariam a acontecer. E nós, povo português, quisemos acreditar. Quisemos mostrar a nossa solidariedade, ajudámos com dinheiro, géneros e rezas…e quisemos seguir em frente, acreditando que tinha sido uma fatalidade e que poderíamos falar disso, muitos anos depois, com um ar pesaroso relembrando aquele fatídico dia de junho de 2017…
Tudo isto aconteceu há quatro meses. Não é tempo suficiente para esquecer uma tragédia nem é tempo suficiente para voltar a vivê-la. Contudo eis-nos mergulhados outra vez, 4 meses depois, no mesmo pesadelo. Mais uma vez aconteceram incêndios incontroláveis (523 no trágico domingo, 15 de outubro, pelo que nos informa a comunicação social). Mais uma vez se morreu em larga escala no nosso país, fruto desses incêndios incontroláveis. Em Pedrógão encontrámos uma estrada da morte. E agora? Em Vouzela morreram pessoas nas suas próprias casas! Mais uma vez assistimos a céus dignos de um cenário de inferno, assistimos a populações completamente cercadas pelo fogo e que só puderam contar com elas próprias, assistimos ao arder de lares, assistimos ao sofrimento em direto. Não aprendemos nada com Pedrógão! Como podemos viver com essa informação, com essas imagens, com essas mortes, com esse sofrimento?! Verifico que a tragédia está sempre demasiado próxima de nós, e que ela permite que aconteça o inimaginável.

E foi esta a segunda facada na minha miragem do 5º Império. Não sei quem são os culpados: território mal ordenado, escassez de meios (continuamos com temperaturas altíssimas mas, parece, que a fase crítica já passou), fogo posto…sei lá…Sei que, ainda mal recompostos da tragédia de Pedrógão, ainda com as memórias demasiado vivas na nossa memória, mais uma vez tivemos que lidar com estradas cortadas, com hectares e hectares de zona verde ardida, com casas destruídas e vidas destroçadas. E é neste momento que entendo que o 5º império sonhado por Fernando Pessoa está ali ao alcance da nossa mão mas ainda não está nas nossas mãos. Um longo caminho foi percorrido mas falta um outro tanto a ser palmilhado para lá chegarmos. Num 5º Império este tipo de tragédia não poderia ser imaginado quanto mais vivido. Como dizia Pessoa (ainda) “Falta cumprir-se Portugal”. Para mim, a miragem do 5º Império desvaneceu-se perante esta tragédia deixando apenas o sabor a mortes inocentes e a imagem dura e negra da realidade ardida.

quinta-feira, 12 de outubro de 2017


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“Por vezes é preciso parar…”
Há um momento na vida em que temos de parar. Um momento em que temos de largar todos os companheiros de estrada, libertarmo-nos de todos pesos e amarras, sentar calmamente e analisar a nossa vida e a nós próprios.
Desde muito cedo que seguimos caminhos já trilhados por outros, caminhos pré-definidos. Os caminhos da nossa vida encontram-se traçados, praticamente, desde o nascimento. Quatro meses após abrir os olhos para o mundo e a maior parte de nós já entrou na rotina. Começamos pelo berçário, infantário, pré-escola, primeiro, segundo e terceiro ciclos, ensino secundário e, se a tanto nos chegar a vontade, a universidade. Rotinas pré-definidas desde o início. Pelo meio surgirão alguns namorados e, quando a idade for aquela que é considerada adequada, surgirá um namorado que permanecerá na nossa vida mais tempo do que o habitual…e seguiremos o caminho natural que é o casamento. A seu tempo surgirão a casa, os filhos, o carro…quem sabe até o cão. A completar este quadro está um emprego que, grande parte das vezes, é rotineiro. Um emprego e uma vida que nos fazem contar os dias que medeiam entre a segunda e a sexta-feira, os dias para o próximo feriado, os dias para as próximas férias, ou os dias para ser realmente feliz.
E, um dia, acordamos e pensamos que a vida não tem sido mais que uma vagarosa sucessão de dias: dias que decorrem lentamente à espera de um “ser feliz” que não acontece. Percebemos que a vida se está a tornar rapidamente insípida e sem cor. Percebemos que não sabemos bem quem somos…nem quem fomos. Não sabemos para onde vamos. E é nesse momento em que acordamos para a realidade que percebemos que parar é essencial. Parar para pensar, parar para analisar, parar para fazer o balanço do que tem sido a nossa vida, parar para nos encontrarmos ou, quem sabe, reencontrarmo-nos.
 Algumas pessoas percebem essa necessidade à medida que vão atingido a maturidade. Outros há, porém, que nunca irão dar esse espaço para parar e, como tal, nunca irão dar espaço para encontrar o seu verdadeiro eu.
Aqueles que fazem a pausa-análise percebem que toda a sua vida, até àquele dia, foi passada caminhando pelos passos dos outros e pelas vontades dos outros. Percebem que aquela vida não foi (na sua maioria) escolhida por eles mas por uma sociedade que os rodeia. E é nessa tomada de consciência que muitas vezes as pessoas param e atiram uma vida de segurança pela janela, mudando radicalmente a sua existência. Mudam de emprego, divorciam-se, mudam de cidade ou até de país. Criam grandes alterações na sua vida, a nível pessoal, profissional ou a todos os níveis. Por isso a sociedade das regras, a sociedade dos caminhos trilhados e seguros considera, muitas vezes, que aquela pessoa enlouqueceu. Só a loucura poderia explicar esse ato de audácia e coragem! E poucos percebem que aquela pessoa não enlouqueceu. Poucos percebem que ela apenas decidiu parar (porque sentiu essa imperativa necessidade), para pensar e analisar a sua vida. E foi precisamente nesse momento que percebeu que não estava a viver a sua vida mas a vida que outros tinham pensado para ela. E revoltou-se contra esta situação. Decidiu oferecer-se tempo para pensar e tomar as atitudes necessárias a fim de se soltar dos pesos e amarras que lhe pesavam e começar a trabalhar, todos os dias, para ser feliz.
Tomada esta atitude, percebe-se que se adquiriu tempo e vontade para observar os caminhos que se quer seguir, as encruzilhadas que se poderá encontrar. Sabe-se que a vida foi tomada nas próprias mãos. A pessoa percebe que já não vive de acordo com as regras de uma sociedade bacoca mas de acordo com as suas próprias regras. Trilha caminhos desconhecidos. Só o poder de tomar esta decisão já lhe traz calma e felicidade. É serena. Não sabe se é feliz a 100% mas sabe que trabalha todos os dias para isso. Não se deixa cair na rotina e no marasmo.
A essa pessoa, e a todas aquelas que perceberam que é preciso parar, que tiveram a coragem de refletir nesse momento de pausa e de mudar aquilo que não lhes fazia bem, apresento a minha maior admiração. Merecem a felicidade que possuem em mãos.

sexta-feira, 6 de outubro de 2017



Pensamentos soltos sobre ódios e rancores
Já uma vez escrevi sobre as palavras. Escrevi sobre aquelas palavras que nos beijam, por gostarmos delas e sobre as que nos causam uma certa inquietação, por não as apreciarmos. Falei de palavras de que gostava, apenas pelo som, e de palavras de que não gostava…pela mesma razão. E ainda falei naquelas palavras que gostava e das que não apreciava pela realidade que retratavam. A palavra “ódio” é um desses vocábulos. Não gosto dela nem um bocadinho. Não pelo seu som…que não me inspira nada de bom mas também nada de mau, mas pela realidade que ela transmite. O ódio transmite-me uma realidade demasiado negra para ser minimamente apreciada. Assumo que nunca senti nem gostaria de sentir tal “afeição” por ninguém (apesar de todos os apesares, é um sentimento que nunca nutri por qualquer ser. Mas, assumo que, por vezes, em determinados momentos, sinto correr um frio pela coluna vertebral abaixo e penso que estou a ser contemplada, através de um olhar frio, com esse sentimento feio e negro).
Associo o ódio a uma profunda antipatia por algo ou alguém, um rancor profundo, uma raiva que ocupa um espaço enorme dentro da pessoa que a sente. Um sentimento claramente negativo que se alimenta de dores, ressentimentos, inseguranças e de todos os sentimentos menos bons que habitam dentro de uma pessoa. Alimenta-se ainda, e essa é a maior fatia, da falta de amor. Facilmente o ódio se instala onde falta o amor: seja o amor por alguém, seja pelas pessoas ou pela vida, … E instala-se, sobretudo, naquelas almas onde falta o amor-próprio. O local onde falta o sentimento mais importante que um ser humano possa ter, o amor-próprio, é um terreno fértil para que o ódio possa nascer e crescer de forma próspera. O alvo desse ódio será aquele que nos parecer mais culpado do nosso mau estar, aqueles que consideramos serem os culpados pela nossa própria dor, tenhamos ou não razões para isso. E, ao alimentar-se de um modo tão voraz de tudo o que de menos bom habita num corpo, vai aniquilando, destruindo a pessoa por dentro ao mesmo tempo que destrói tudo aquilo em que a pessoa que sente tal ódio toca, ou tudo o que está por perto.
 O ódio será, quanto a mim, um dos piores sentimentos que se possa conter dentro da nossa alma. É altamente perigoso. Perigoso, sobretudo, porque até certo ponto, pode fazer-nos sentir saciados e aliviados. Alimenta a alma quando esta se sente, por algum motivo, desassossegada por algo que correu menos bem na sua vida. Alimenta a alma quando esta se sente vazia. Contudo, ao mesmo tempo que a faz sentir, temporariamente, saciada, vai destruindo tudo o que de bom possa ainda existir naquele corpo e alma. O alimento que este ódio oferece mais não é do que umas ervas venenosas para a alma, e para a própria pessoa, que a vão corroendo e destruindo. A sensação de saciedade é meramente ilusória. E a necessidade de se alimentar é cada vez maior, aumentando o negrume dos sentimentos que habitam coração e alma. Até ao momento em que, se nada for feito contra, nada restará de bom nem de luminoso naquela pessoa.
Alimentar algo que nos faz tão mal, e que provavelmente iremos perceber a seu tempo que não nos traz nada de bom, só prova, como disse, a existência de uma enorme falta de amor-próprio e alguma falta de inteligência emocional. O inteligente a nível emocional sofre sim, com as situações menos agradáveis que a vida lhe traz. Sofre, chora, mas segue em frente. Aprende a ignorar a pessoa e/ ou situação que lhe provocou dor e sofrimento. Supera. Caminha noutra direção. Deixa de dar importância à situação e/ ou pessoa. E essa é a maior prova que estamos perante uma pessoa que se ama a si acima de tudo e que tem inteligência para se afastar do caminho que é o da raiva – ódio – sofrimento.

Depois de todo este discurso, mal seria dizer que já odiei!! E a verdade é que não poderia dizê-lo uma vez que nunca odiei. Não sou uma pessoa de alimentar raivas e muito menos ódios. Não sou perfeita! Longe disso. Tenho explosões de mau humor que fazem lembrar o Big Bang. Lanço as minhas irritações maiores e menores, algum mal-estar, para todo o lado, atingindo, naquele momento, os que estão mais próximos. Assumo. Mas, também ouço várias vezes que tenho uma boa aura ou uma boa energia. E, talvez seja por isso, a verdade é que nunca odiei. E sim, já passei por situações em que o caminho mais simples seria esse do ódio. Mas, esse sentimento feio não faz parte de mim (valha-nos ao menos isso!). Sofri, chorei e segui em frente. Não quero com isto dizer que continue a gostar e a considerar as pessoas que me fizeram sofrer. Nada disso. Afastei-as da minha vida, passando a ignorá-las. Não sei se as perdoei. Sei que, para mim, deixaram de existir. E não se odeia quem não existe. Não permiti e espero nunca vir a permitir que o ódio por ninguém se instale na minha alma. Até porque, como disse Martin Luther King, Tenho visto demasiado ódio para querer odiar.