Texto publicado no P3 - http://p3.publico.pt/cultura/exposicoes/23996/quotviva-la-vidaquot-celebrando-frida
“Viva la Vida[1]
– Celebrando Frida”
Há 110 anos nascia, no dia 6 de
julho, Magdalena Carmen Frida Kahlo y Calderón. A pintora mexicana mundialmente
conhecida por Frida Kahlo. Para além de passarem 110 anos do seu nascimento, sabe-se
que a mesma faleceu muito jovem, com apenas 47 anos. Como tal, sobre a sua
morte passam já 63 anos. Ainda assim, e neste julho de 2017, pergunto: “haverá
alguém que não conheça Frida Kahlo e a sua imagem?” Tenho as minhas dúvidas!
Seria pertinente perceber por que razão será
Frida, ainda hoje, um ícone tão conhecido e tão comentado. É claro que estamos
a falar de uma artista, uma pintora fantástica de reconhecido talento. Só este
facto serviria, por si só, de resposta à minha questão. Contudo, penso que o
conhecimento e o interesse por Frida Kahlo vão muito para além da artista que
se escolheu a si própria como tema principal dos seus quadros, vão muito para
além desta denominada surrealista (surrealismo que ela não reconhecia na sua
obra). Frida será ainda hoje conhecida pela sua arte, mas também pela sua
imagem, pela forma intempestiva com que viveu a sua vida, pela sua paixão, pela
sua própria imagem tão marcada como marcante, pelo espírito livre que
demonstrou ser. Vejamos alguns factos que a tornaram, quanto a mim, um ícone
mexicano reconhecido mundialmente.
·
A sua forma de vestir: desde muito nova que
Frida demonstrou ter vontade de desconstruir conceitos e ultrapassar barreiras
culturais. Quebrou vários tabus na sua época. Apresentava-se, nas suas
vestimentas, da forma que mais lhe agradava, pouco se preocupando com as modas
ou com convencionalismos. São conhecidas as fotografias de Frida vestida como
um dandy bem-apessoado, aquando da sua adolescência. Acredito que a sociedade
mexicana ficaria bem chocada com esta jovem vestida de homem, de sobrancelha
grossa e bigode. Mais tarde, diz-se que pelas fragilidades físicas apresentadas
pelo seu corpo (uma perna mais magra que a outra e mais curta, fruto da
poliomielite e de um acidente de viação), começou a usar roupas que as disfarçassem,
nomeadamente, as saias compridas e garridas, típicas da cultura mexicana. A
isso associou os acessórios coloridos, as flores e fitas nos seus penteados,
frequentemente de tranças feitos. Incorporou, tanto na sua arte como na sua
forma de vestir, símbolos indígenas e mexicanos. E foi esta a imagem que ela
apresentou nos EUA quando lá viveu ou em qualquer país europeu que tenha
visitado, tão fora do que era considerado “a norma” na época. E é esta, sem
dúvida, a imagem que ainda hoje é recordada.
·
A sua forma de amar: Frida apresentou ao mundo,
sem complexos, a sua bissexualidade. Apesar do amor, diria, doentio pelo seu
marido (o também pintor, Diego Rivera) ficaram largamente conhecidos os seus
romances, fogosos, tanto com homens como com mulheres.
·
A sua personalidade e o seu modo de estar: pelo
que conhecemos de Frida, percebemos que se tratava de uma personalidade forte,
denotando-se essa personalidade na forma como se vestia, na intensidade com que
procurou viver, apesar de todos os dissabores que foi sofrendo ao longo da
vida, na forma como sempre lutou pelos direitos e pela afirmação da mulher. Era
uma mulher que teria todas as razões para vestir a sua vida de luto mas que
escolheu vesti-la de cores e de flores. A sua grande fragilidade seria o amor
que alimentava por Diego, amor salpicado por traições mútuas que a iam
enfraquecendo e destruindo a sua autoestima. Terá dito que teve dois grandes
acidentes na vida: o do autocarro onde ficou gravemente ferida e conhecer Diego
Rivera. Esse segundo seria o pior acidente, nas suas palavras.
·
A resiliência com que encarou a dor e o
sofrimento: o sofrimento físico esteve sempre muito aliado ao sofrimento
emocional. Contudo ela escolheu transformar esse sofrimento na festa de cores
que se lhe conhece, em algo de positivo. É-lhe atribuída a autoria de uma frase
que sintetiza bem esta ideia: “A arte mais poderosa da vida é fazer da dor um
talismã que cura; uma borboleta renasce florida numa festa de cores!” Essa
força e essa resiliência ficam bem patentes naquela que será a sentença mais
conhecida da pintora “pés para que os quero se tenho asas para voar?”
(Relembre-se que muitas vezes Frida Kahlo teve, ao longo da sua vida, de se
deslocar em cadeira de rodas e que chegou a ser-lhe amputada uma perna).
Contudo, e apesar de todas estas
características positivas, F. Kahlo levou uma vida de altos e baixos. Alternava
períodos de grande sociabilidade com períodos mais depressivos que culminavam,
muitas vezes, em tentativas de suicídio. As últimas palavras que se encontram
no seu diário são que espera partir e não voltar a este mundo: “espero alegre a
minha partida e espero não retornar nunca mais”. Diz-se que terá morrido de
embolia pulmonar…aos 47 anos. Outros dizem que terá sido mais uma tentativa de
suicídio (bem sucedida, desta feita).
O certo é que Frida nasceu há 110
anos. Foi sem dúvida uma mulher à frente no seu tempo. Provavelmente sê-lo-ia
ainda hoje. Lutou pelos direitos das mulheres e mostrou ser um exemplo singular
de inteligência e caráter. Viveu intensamente. Rompeu com padrões morais e
estéticos da época. Foi, acima de tudo uma mulher apaixonada mas independente e
forte que viveu de acordo com os seus próprios princípios. A sua imagem
representa, ainda hoje, a liberdade de ser única. E por ser única, fez a capa
da Vogue em 2012, 58 anos depois da sua morte…
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