terça-feira, 18 de julho de 2017



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  http://p3.publico.pt/actualidade/ambiente/24113/ferdinando-o-touro-e-suas-mensagens-anti-taurinas

“Ferdinando, o Touro e as suas mensagens anti-taurinas”

Está prevista para dezembro deste ano a estreia em Portugal do filme de animação “Ferdinando, o Touro”. Estamos a falar de uma nova versão da curta-metragem de animação da Walt Disney que, por sua vez, era baseada na obra de Munro Leaf, “A História de Ferdinand”. Pela visualização do trailer que já foi lançado publicamente, parece-me que a personagem principal da curta-metragem de 1938 mantém as suas características. Ou seja: estamos perante um touro que prefere observar a paisagem, sentir o aroma das flores, à sombra de uma árvore, do que treinar para ser escolhido para as touradas. Temos presente um animal terno, meigo e muito calmo que é escolhido por engano para participar numa tourada, tendo em conta o seu enorme porte. Na versão de 1938 é anunciada a sua ferocidade e bravura mas, quando o animal entra na arena, o seu único interesse é um ramo de flores que o toureiro traz na mão. Estamos perante uma personagem que foge ao padrão atribuído à sua raça, um pacifista que se nega a ser violento. No fundo, tanto o livro, como a curta-metragem e, penso, também será o caso nesta longa-metragem que irá estrear, defendem um clima de paz e não-violência, assim como de tolerância. Diz-se que Hitler terá ordenado que a obra de Munro Leaf fosse queimada. Diz-se também que era uma das obras preferidas do pacifista Ghandi. Em Espanha chegou a ser proibida por se considerar que era uma crítica à Guerra Civil nesse país. Como qualquer grande obra de literatura, várias são as interpretações que se podem ter e será eventualmente por isso que já se ouvem algumas vozes que mencionam o facto de o filme ter informações anti-taurinas (e ainda só assistimos ao trailer!)  
No que me diz respeito (e sei que estou a pisar um ninho de vespas) parece-me muito bem que o filme tenha essas informações (se é que as tem). Esse “desporto” a que chamam tourada mais não é para mim que um espetáculo lamentável realizado às custas do sofrimento de um ser vivo para gáudio de uma audiência que rejubila perante o sofrimento do touro que nada fez para estar a ser torturado. Sei que esta é uma discussão inútil. Depressa se irão levantar as vozes argumentando sobre a nobreza e a arte da tourada (que assumo, não consigo encontrar nem perceber). Sei que irão tecer argumentos vários. O principal? A tradição milenar! Não se pode acabar com uma tradição do país. Seria perdermos um pouco da nossa identidade! No seguimento dessa ideia de manter a tradição seria normal termos ainda arenas ocupadas com gladiadores. Certo? No que a mim me diz respeito, tradições destrutivas ou que façam sofrer seres vivos não são para manter. E esse é o caso das touradas.
Gosto particularmente de um segundo argumento: o touro é muitíssimo bem tratado durante a sua vida (e não tenho dúvidas disso porque sempre que sou assaltada por alguma imagem de touradas na televisão, verifico que o touro tem um aspeto extremamente saudável). Mas…ser bem tratado em vida dá-nos o direito de lhe oferecer uma morte tão violenta? A minha gata não iria gostar de ter essa informação!
Também não suporto a ideia de que existe honra e que a tourada presta homenagem à força e ferocidade do touro…Mais uma vez são imagens que não consigo ligar: honramos, torturando? Não consigo entender…
E, por fim, o argumento mais pesado: os touros bravos são criados apenas e só com a finalidade de serem lidados. Abolindo touradas, abríamos caminho para a extinção da espécie. E a isto respondo, e perdoem-me se isto soa a alguma frieza mas…manter uma espécie apenas e só com o intuito de, mais cedo ou mais tarde, a fazer sofrer, traz algo de bom a essa espécie? Penso que não…mais uma vez não me faz sentido.
Tendo discutido várias vezes este assunto com aficionados das touradas, ouvi, mais do que uma vez a famosa “tens de presenciar o espetáculo para o entenderes”. Ao que respondo: “presenciei algo parecido e não gostei nem um pouco!” Passo a explicar: na minha época de estudante de Coimbra era tradição, na semana académica, assistir à garraiada na Figueira da Foz. E eu lá fui um ano… (inconsciência da juventude). Apesar de não apreciar nem um pouco garraiadas, pensei que a brincadeira com um vitelo não seria muito violenta para o mesmo. Qual não foi o meu espanto quando vi que estavam presentes animais de um porte considerável e que eram lidados tendo-lhes sido espetadas as famosas bandarilhas. Sinceramente…não senti a honra de que tanto falam. Senti angústia, tristeza e remorso por estar a assistir a um espetáculo onde se derramava o sangue de um animal… Para experiência bastou. Não preciso, nem quero, assistir a mais qualquer tipo de espetáculo do género.
Voltando ao “Ferdinando, o Touro”…espero que o filme continue, tal como o livro em que se baseia, a passar uma mensagem de não-violência, uma mensagem de aceitação da diferença e sim, espero que traga com ele uma mensagem anti-taurina… Espero que os espetadores saiam da sala de cinema com essas mensagens bem claras na mente.

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