http://p3.publico.pt/actualidade/sociedade/25484/geracao-floco-de-neve#.WnmwXocutpk.facebook
A Geração Floco de Neve
Vivemos
numa era em que já nos é impensável viver sem redes sociais. Habituámo-nos, por
demais, a apresentar aos outros os pequenos acontecimentos da nossa vida, a
repartir as nossas alegrias, a demonstrar os bons e os maus momentos, a partilhar
os momentos que consideramos mais interessantes, a ilustrar todo e qualquer
momento do nosso dia através de fotografias. É claro que falo de um modo geral
e é óbvio que alguns se irão expor bem mais do que outros. A par com essa partilha
do nosso dia-a-dia está, de um modo cada vez mais vincado, a partilha de
opiniões. Quer seja através de uma página pessoal numa rede social, quer seja
através de um blogue ou até mesmo em grupos formados para congregar pessoas que
comungam do mesmo interesse, a verdade é que todos nós temos algo para dizer
sobre o mundo e os seus grandes e pequenos acontecimentos, todos nós gostamos
de apresentar a nossa forma de percecionar este “planeta azul” e os humanos que
nele habitam, todos gostamos de tecer comentários sobre a nossa forma de o
tentar compreender, todos (ou a maior parte de nós) gostamos de fazer
observações mais ou menos atentas sobre as notícias diárias que nos chegam do
país e do mundo. E o que à partida poderia ser algo de muito positivo – da partilha
de ideias e de opiniões várias só poderia resultar ideias novas, perspetivas
diferentes sobre os assuntos em questão – torna-se, muitas vezes como um
verdadeiro pesadelo. Assistimos a verdadeiros lutas de gladiadores em que cada
um tenta impor a sua verdade, sem aceitar a verdade do outro, até porque, a
maior parte das vezes nem se coloca em questão que o outro possa ter qualquer
tipo de razão. Penso que esta facilidade que as redes sociais nos ofereceram em
poder comunicar tudo e a toda a hora veio por a nu uma característica de muita
gente que navega por “estas bandas”: a dificuldade das pessoas em aceitar
pontos de vista diferentes.
Curiosamente,
cruzou-se aqui há dias comigo um artigo que versava, entre outras coisas, sobre
esta dificuldade cada vez maior em aceitar pontos de vista diferentes. Pela
leitura do mesmo percebi que, de acordo com vários autores, se tornou habitual
classificar aqueles que atingiram a idade adulta na década de 2010 como a “Geração Floco de Neve”. Não quero aqui
discorrer sobre este velho hábito de classificar com um nome uma geração como
se ela caracterizasse todos os seus elementos. Todos ouvimos falar, ao longo
dos anos dos baby boomers, após a
Segunda Guerra Mundial, a que se seguiu a Geração
X e mais tarde, os Millenials. Efetivamente,
algumas características semelhantes poderão ser encontradas nestas gerações,
ainda que o hábito de rotular me incomode um pouquinho. Mas a verdade é que a
descrição feita sobre esta “Geração Floco
de Neve” me fez imenso sentido, tendo alguma facilidade em identificar
nessa descrição comportamentos e formas de ser que encontramos diariamente nas
redes sociais.
De acordo com a descrição, estamos perante uma
geração formada por pessoas que são extremamente sensíveis a pontos de vista
diferentes, pontos de vista que possam desafiar a sua visão do mundo. E não é
exatamente isso que encontramos nas redes sociais? Muitos dos comentários que
lemos, profundamente ofensivos, mais não são que manifestações de revolta
contra a ousadia de alguém que teve a audácia de apresentar um ponto de vista
(o seu) que, por acaso, é contrário ao da pessoa que estava a ler. Encontramos
nessas pessoas uma certeza que existe apenas uma verdade e que por isso qualquer
opinião que coloque a sua verdade em causa estará a atentar contra a ordem das
coisas e será, por isso, perigosa.
Que
outros traços identificamos nesses representantes da “Geração Floco de Neve” que encontro simultaneamente nos
“comentadores das redes sociais”? Diria uma suscetibilidade excessiva, uma
sensibilidade à flor da pele que as leva a reagirem de forma agressiva sempre
que as suas convicções são postas em causa. Esta agressividade, tão presente
nas redes sociais, será resultado, como disse de uma dificuldade em aceitar o
outro e as suas opiniões, de uma postura de inflexibilidade perante a
diferença, de uma fraca tolerância à frustração (provocada pela emissão de
opiniões diferentes à sua) e de uma débil resiliência, uma vez que não
apresenta capacidade de superar as pequenas contrariedades (opiniões
diferentes) sem o fazer de forma hostil e belicosa. São pessoas que criaram
“espaços seguros” onde nada é posto em causa, onde existe uma ordem das coisas
e é essa ordem que deve ser seguida e nunca questionada.
Como
referi anteriormente, é perigoso e desadequado rotular toda uma geração. Há que
sublinhar, também, que a definição de “Geração
Floco de Neve” vai muito para além das características que aqui referi, não
sendo o objetivo desta crónica caracterizar a geração assim denominada. O termo
foi usado uma vez que me foi impossível ler sobre esta “Geração Floco de Neve” e não identificar peculiaridades e
comportamentos (associados a esta geração) numa grande fatia dos seres que
pululam por estas redes sociais. A saber, seres que comentam notícias,
crónicas, pontos de vista de um modo agressivo, inflexível, demonstrando a sua
rigidez para com os outros, a sua manifesta dificuldade em perceber que não há
uma verdade mas muitas verdades e o desconhecimento de que para observar bem o
mundo temos de fazê-lo olhando para tudo o que nos rodeia e não apenas e só em
frente.
Sem comentários:
Enviar um comentário