quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018


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                                                                                         KEVIN HENDERSEN/UNSPLASH




A Geração Floco de Neve

Vivemos numa era em que já nos é impensável viver sem redes sociais. Habituámo-nos, por demais, a apresentar aos outros os pequenos acontecimentos da nossa vida, a repartir as nossas alegrias, a demonstrar os bons e os maus momentos, a partilhar os momentos que consideramos mais interessantes, a ilustrar todo e qualquer momento do nosso dia através de fotografias. É claro que falo de um modo geral e é óbvio que alguns se irão expor bem mais do que outros. A par com essa partilha do nosso dia-a-dia está, de um modo cada vez mais vincado, a partilha de opiniões. Quer seja através de uma página pessoal numa rede social, quer seja através de um blogue ou até mesmo em grupos formados para congregar pessoas que comungam do mesmo interesse, a verdade é que todos nós temos algo para dizer sobre o mundo e os seus grandes e pequenos acontecimentos, todos nós gostamos de apresentar a nossa forma de percecionar este “planeta azul” e os humanos que nele habitam, todos gostamos de tecer comentários sobre a nossa forma de o tentar compreender, todos (ou a maior parte de nós) gostamos de fazer observações mais ou menos atentas sobre as notícias diárias que nos chegam do país e do mundo. E o que à partida poderia ser algo de muito positivo – da partilha de ideias e de opiniões várias só poderia resultar ideias novas, perspetivas diferentes sobre os assuntos em questão – torna-se, muitas vezes como um verdadeiro pesadelo. Assistimos a verdadeiros lutas de gladiadores em que cada um tenta impor a sua verdade, sem aceitar a verdade do outro, até porque, a maior parte das vezes nem se coloca em questão que o outro possa ter qualquer tipo de razão. Penso que esta facilidade que as redes sociais nos ofereceram em poder comunicar tudo e a toda a hora veio por a nu uma característica de muita gente que navega por “estas bandas”: a dificuldade das pessoas em aceitar pontos de vista diferentes.
Curiosamente, cruzou-se aqui há dias comigo um artigo que versava, entre outras coisas, sobre esta dificuldade cada vez maior em aceitar pontos de vista diferentes. Pela leitura do mesmo percebi que, de acordo com vários autores, se tornou habitual classificar aqueles que atingiram a idade adulta na década de 2010 como a “Geração Floco de Neve”. Não quero aqui discorrer sobre este velho hábito de classificar com um nome uma geração como se ela caracterizasse todos os seus elementos. Todos ouvimos falar, ao longo dos anos dos baby boomers, após a Segunda Guerra Mundial, a que se seguiu a Geração X e mais tarde, os Millenials. Efetivamente, algumas características semelhantes poderão ser encontradas nestas gerações, ainda que o hábito de rotular me incomode um pouquinho. Mas a verdade é que a descrição feita sobre esta “Geração Floco de Neve” me fez imenso sentido, tendo alguma facilidade em identificar nessa descrição comportamentos e formas de ser que encontramos diariamente nas redes sociais.
 De acordo com a descrição, estamos perante uma geração formada por pessoas que são extremamente sensíveis a pontos de vista diferentes, pontos de vista que possam desafiar a sua visão do mundo. E não é exatamente isso que encontramos nas redes sociais? Muitos dos comentários que lemos, profundamente ofensivos, mais não são que manifestações de revolta contra a ousadia de alguém que teve a audácia de apresentar um ponto de vista (o seu) que, por acaso, é contrário ao da pessoa que estava a ler. Encontramos nessas pessoas uma certeza que existe apenas uma verdade e que por isso qualquer opinião que coloque a sua verdade em causa estará a atentar contra a ordem das coisas e será, por isso, perigosa.
Que outros traços identificamos nesses representantes da “Geração Floco de Neve” que encontro simultaneamente nos “comentadores das redes sociais”? Diria uma suscetibilidade excessiva, uma sensibilidade à flor da pele que as leva a reagirem de forma agressiva sempre que as suas convicções são postas em causa. Esta agressividade, tão presente nas redes sociais, será resultado, como disse de uma dificuldade em aceitar o outro e as suas opiniões, de uma postura de inflexibilidade perante a diferença, de uma fraca tolerância à frustração (provocada pela emissão de opiniões diferentes à sua) e de uma débil resiliência, uma vez que não apresenta capacidade de superar as pequenas contrariedades (opiniões diferentes) sem o fazer de forma hostil e belicosa. São pessoas que criaram “espaços seguros” onde nada é posto em causa, onde existe uma ordem das coisas e é essa ordem que deve ser seguida e nunca questionada.

Como referi anteriormente, é perigoso e desadequado rotular toda uma geração. Há que sublinhar, também, que a definição de “Geração Floco de Neve” vai muito para além das características que aqui referi, não sendo o objetivo desta crónica caracterizar a geração assim denominada. O termo foi usado uma vez que me foi impossível ler sobre esta “Geração Floco de Neve” e não identificar peculiaridades e comportamentos (associados a esta geração) numa grande fatia dos seres que pululam por estas redes sociais. A saber, seres que comentam notícias, crónicas, pontos de vista de um modo agressivo, inflexível, demonstrando a sua rigidez para com os outros, a sua manifesta dificuldade em perceber que não há uma verdade mas muitas verdades e o desconhecimento de que para observar bem o mundo temos de fazê-lo olhando para tudo o que nos rodeia e não apenas e só em frente. 

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