“Notas sobre um
Quarteto e a Amizade”
“Sabem quem é que vocês as 3 me
lembram?” A pergunta foi-nos colocada no decorrer de um agradável jantar e nós,
por simpatia, ou porque esperávamos que qualquer uma das três respondesse,
deixámos a pergunta a pairar um pouco no ar. Em seguida, uma das três respondeu,
com um ligeiro tom de voz interrogativo:
“O Sexo e a Cidade?” O tom ligeiramente inquisitivo pretendia não dar a
entender que tínhamos a certeza da resposta até porque já tínhamos ouvido
muitas mais vezes esta comparação.
Ainda que nessa noite, e nessas
férias, fôssemos apenas três, o grupo por inteiro, o denominado “Quarteto” é
composto, como o próprio nome indica, por quatro elementos. E, efetivamente,
não foi a primeira vez que essa comparação nos foi feita. Verdade seja dita até
nós mesmas, os membros do “quarteto” nos reconhecemos nesta comparação. Não que
nos identifiquemos completamente com as personagens. Penso que nenhuma de nós
será tão extrovertida e sexualmente liberal como a divertida Samantha ou tão racional,
chegando a ser meio cínica (sobretudo no que aos homens diz respeito) como a
Miranda. Mas a verdade é que nos identificamos e reconhecemos em alguns
momentos e características daquelas personagens e sobretudo, identificamo-nos na
amizade sólida que une aquelas mulheres.
Tal como as personagens de “O Sexo
e a Cidade” cultivamos uma amizade que já é bem longa. Três dos elementos
conhecem-se desde a adolescência. Eu cheguei mais tarde, pela mão de um
namorado da época, e apraz-me dizer que entre os despojos dessa relação já
desaparecida ficou uma amizade que já conta mais de uma quinzena de anos. E, como
se diz por aí, uma amizade que dure mais de 7 anos tem grandes probabilidades
de se manter para toda a vida. Como tal, estou certa que este quarteto ainda
fará por se reunir quando todas estiverem bem velhinhas, à volta de uma mesa
para bebericar uma chávena de chá.
Tendo em conta os anos que já
soma esta amizade, já passámos por vários estádios: solteiras, com pouco mais
que amizades coloridas, com namorados, passou-se por vários casamentos e até por
um divórcio. Em todas as situações os pretendentes foram altamente analisados.
Afinal, só queremos o melhor para as amigas. Em todas as situações, mais cedo
ou mais tarde, o grupo foi ouvido e inquirido sobre as situações que se
apresentavam mais difíceis ou problemáticas. E esta é mais uma das
características deste grupo de amigas. A reunião, semanal, mensal, ou sempre
que possível (dependendo do ritmo de vida de cada uma) sempre existiu. Em frente
a uma chávena de café, uma bebida preferida – que foi alterando ao longo dos
tempos – desde o Favaios, ao gin, passando pelo mojito, ou um prato de comida
num qualquer restaurante da moda ou que desejávamos conhecer, a conversa sempre
aconteceu, relatando desde os acontecimentos mais pequenos, às tragédias
maiores. É sobretudo nesta união que nos identificamos com a série “O Sexo e a
Cidade”. Nesta aliança existente entre as quatro que permite que o problema de
cada uma seja também um pouco o problema da outra assim como a felicidade de
uma é parte da felicidade de outra. Sabemos por isso que podemos contar umas
com as outras. Como diz Marguerite Yourcenar “Amizade é certeza”. E essa
certeza mora em nós. É claro que não somos um grupo fechado e cada uma cultiva
outras grandes amizades, pessoas que também fazem parte do nosso grupo de amigos,
com as quais convivemos, rimos, divertimos e, por vezes, choramos. Isto é,
outras amizades com quem partilhamos a nossa vida. Contudo, este quarteto tem história
e por isso é diferente:
Tem um passado construído de momentos
hilariantes que levam à existência de uma enorme cumplicidade. Um passado
construído por momentos que, se não fossem da vida real, seriam improváveis de
acontecer (lembram-se daquela vez que entrámos atrasadíssimas no cinema? Aquela
vez em que incomodámos uma fila inteira para sentar nas únicas 3 cadeiras que
estavam livres naquela sala? Aquela vez que, afinal, estávamos enganadas na
sala e voltámos a incomodar uma fila inteira para sair? Lembram-se qual era o
filme? “O Sexo e a Cidade”, pois claro!) Que situação tão hilariante! O que
gargalhamos! Penso que será essa característica que sempre nos definiu: uma
extrema vontade de gargalhar e uma enorme cumplicidade.
Mantemos no presente um modo de
estar que poderia definir, em bom português como: «se uma diz “mata”, a outra
dirá “esfola” e uma terceira dirá “imediatamente”». E é essa cumplicidade que é
maravilhosa. Temos um presente em que cada um dos elementos sabe que, por mais
louca que a ideia seja, haverá sempre um membro que dirá “vamos lá”. A maior
parte das vezes, todos os elementos estão de acordo quando se propõe uma
brincadeira ligeiramente pintada de loucura: que seja fazer um vídeo a cantar
com as nossas belas vozes no carro, que seja ir para a Serra gritar para
afugentar o stress (apenas porque
alguém se lembrou que é Dia do grito) debaixo de uma torrencial chuva ou que
seja uma qualquer outra loucura que alguém se lembre no momento. Compreendemos
que as coisas são mais divertidas quando realizadas em grupo (daí a nossa “fatiota”
de Carnaval ser sempre pensada para as quatro) e que as coisas mais pesadas e
difíceis também são mais leves quando partilhadas pelas quatro (daí os famosos
jantares de “não colocadas”, por exemplo). Já passámos por muitos bons momentos
e, claro, também por maus momentos. Em todos eles estivemos presentes e fomos
um dos apoios da outra. E sempre que nos foi possível respondemos a tudo com
uma gargalhada sonora porque percebemos que o queixume e a tristeza não nos
levarão a lado nenhum.
Por isso, penso que não será
descabido pensar que faremos parte do futuro umas das outras. Já existem
filhos. Naturalmente, somos tias das crianças. Vimo-los nascer, vemo-los
crescer e são tão do nosso sangue como se fossem mesmo do nosso sangue.
Envelheceremos (esperemos) a fazer parte da vida umas das outras. Assumo que
imagino que seremos umas “velhas gaiteiras” sempre prontas para um passeio, um
baile e uma gargalhada!
Somos um quarteto. Quatro
mulheres. Não somos iguais. Cada uma tem o seu feitio especial (especialíssimo,
até!) Somos uma mistura de personalidades, com vidas, neste momento, bem
diferentes. Cada uma seguiu um caminho que trilhou sozinha apesar de ter por
perto a companhia das outras. Algumas vezes até chocamos. Contudo, no fim de
tudo, há sempre lugar a uma boa gargalhada que coloca tudo no seu lugar. As
raízes da amizade que existem em nós têm sido mais fortes que estes choques
frontais e continuamos por essa vida fora, a gargalhar sempre que possível
(mesmo que por vezes a gargalhada sirva apenas para abafar a tristeza e a
lágrima) e a tentar tirar o melhor partido da vida e desta amizade. Compreendemos,
como diz a letra da canção, que “juntos, somos mais fortes”.
Mais do que uma vez fomos
comparadas às quatro de “O Sexo e a Cidade”. E, de facto, as semelhanças com as
quatro de Nova-York existem. Constato-as
na união e amizade que existe entre as 4 da Covilhã, na força e resiliência que
cada uma tem apresentado ao longo da sua vida e na capacidade de, no fim de
tudo, dar uma enorme gargalhada em desafio à própria vida.
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